Gazeta das Províncias nº13 02-02-1899

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CERTÁ — Quinta feira 2 de Fevereiro de 1899
N.º 13
sSemanario independente.
ASSIGNATURA
CERTÃ, mez, 400 rs. FÚRA DA CERTA, trimestre, 330 15. AFRICA, semestro, 1$000 rs. BRAZIL, semestre, 25500 rs. Numero avulso, 30 75.
“Poda a correspondencia dirigida à Administração, R. Sertorio, 17. Os originaes recebidos não se devolvem
Ernesto Marinha — Director
FUBLICAÇÕES
No corpo do jornal, cada linha 80 rs. Anmuncios, 40 rs. a linha. Repetição, 20 rs. a linha, Permanentes, preço convencional; os srs, assiguantes
têm 0 desconto de 25 0/5. Esta folha é impressana Imprensa Academica, R. da Sophia. Coimbra
Augusto Rossi — Editor
TOA
||
Dentro em breve, o seculo XIX
vae desapparecer nos abysmos do tem-
po, parecendo legar ao seculo XX o fer-
mento de ruidosos cataclysmos sociaes.
A historia, tremula e assombrada,
prepara-se para marcar novas épocas
e para registar novos factos. Outros
destinos estão suspensos sobre as nos-
sas cabeças. O futuro, não obstante a
sua sombra de incertezas, deixa-nos lo-
brigar no horisonte, pela marcha que
levam as coisas, os clarões phantasticos
que, desenvolvendo-se, tudo irão in-
cendiar!
A humanidade contempla receosa
o que a rodeia, e vê espantada a pre-
cipitação dos acontecimentos.
— Que extranho momento será
este que assim tem tudo em nervosa
expectação? Que mão potente ameaça
gacudir o mundo nos seus fundamentos?
Olhemos… Dos extraordinarios
progressos da nossa época resultou,
com uma evidencia assombrosa, o des-
envolvimento das grandes industrias,
e, como consequencia logica, um capi-
talismo devorador e absorvente, E? a
lei natural: da luz é que se gére o mor-
rão. As invenções e descobertas de
cada dia tendem a multiplicar a pro-
ducção das riquezas, conduzindo a uma
concentração esmagadora,
D’ahi a chamada questão social.
O proletariado enxameia as cida-
des, 4 procura de trabalho, com os fi-
lhos atraz, pallidos de fome, contor-
cendo-se em dôr. Por toda a parte, as
portas são-lhe dadas na cara. Às ma-
chinas roubam-he o logar em nome do
progresso. Não encontra nem o traba-
lho, que é o desafogo do desesperado,
nem a esmola, que é o supremo recur-
so da miseria! E assim leva a exis-
tencia…
As pequenas industrias estão sobre
um precipício. A morte abre-lhes as
garras hediondas. Mal podem hoje sub-
sistir ante a concorrencia poderosa das
grandes industrias; e, por Isso, O tra-
balho manual e o trabalho do pensa-
mento não encontram a compensação
condigna. O capital, pesado como a
materia bruta, escravisa-os, com ume
superioridade desdenhosa.
– Na oficina, o braço, que sustenta
o martello, cáe desalentado; no gabi-
nete do homem de sciencia, a alma es-
– váe-se em tinta negra,
– Não póde ser mais melindrosa do
que é a sorte do proletariado moderno,
Para elle, o fogo apaga-seno lar, a prole
»
tem como escola a vadiagem, a dôr af-
foga-se na taberna, e a esposa pára pe-
las esquinas, prostituindo-se ao primei-
ro transeunte para matar a fome.
*’Talo triste espectaculo que se des-
enrola nos principaes centros indus-
triaes e que tende a alastrar-se a todos
os outros centros de população! …
Nºesta dificil conjunctura, os cere-
bros dos pensadores rutilam para dar
musculos aos braços e Incitamentos á
vontade. E o que é certo é que da luz
d’esses cerebros irvadia a luz d’uma
nova ideia, — a grande alma esperan-
cosa do futuro !
Desde o socialismo evolucionista de
Karl Marx e de Benoit Malon até ás
doutrinas revolucionarias de Emile Re-
clus, Kroptokine, Bachounine e Jean
Grave são multiplas as soluções apre-
sentadas como remedio ás enormes dif-
ficuldades do presente. No emtanto,
o systhema marxista, se tem, como é
facto, dado impulso á marcha de prin-
cipios altamente humanitarios, certo é
que não tende a vingar em toda a sua
amplitude: a vontade individual énºelle
absorvida por um grosseiro e conde-
mnavel materialismo economico. Pelo
que respeita ao socialismo anarchico ou
revolucionario, tem elle o defeito de as-
sumir as côres d’uma chimera infantil,
Pretende implantar-se á custa de
processos barbaros e selvaticos, e crê
exageradamente n’uma futura bondade
intensa da humanidade, esquecendo a
existencia do egoismo, a grande força
providencial que é ae mesmo tempo ob-
staculo a uma pretensa abnegação ab-
soluta da alma.
Evitar o predominio d’essas cor-
rentes impetuosas é o dever de quem
deseje a ordem e a paz. Justo é, po:
rém, confessar que, de invalta com os
seus exageros, veem elementos de va-
lor, verdades aproveitaveis que importa
não despresar.
Urge, pois, organisar um systhema
que constitua de futuro o programma
das sociedades pacificas — systhema
que corresponda em tudo ás legitimas
aspirações da hora presente!
Esse systhema, a nosso vêr, parece-
nos brilhantemente elaborado já pela
escola realista de Savigny, esclarecida
pela escola philosophica de Kranse e
magistralmente completada pela escola
economica de Engels e Brentano, ad-
diccionadas as correcções de D’Aguano.
Ao Estado deve competir a creação
de condições proprias para o desenvol-
vimento e satisfação das necessidades
sociaes, E
Onde fôr defeituosa a iniciativa ini-
ciativa individual, lá deve estar elle
para suppril-a; onde a actividade par-
ticular prime pela sua ausencia, deve
intromettera sua propria administração.
Proporcione um trabalho remune-
rador ao operario robusto; offereça um
leito no hospital ao enfermo necessitado;
abra um asylo para o indigente incapaz.
Para o maior desenvolvimento pos-
sivel da riqueza economica, trace e exe-
cute planos geraes de vias de commu-
nicação; fiscalise o trabalho das crean-
ças e das mulheres, não permittindo
que o capitalista avaro lhes imponha
sacrifícios superiores ás suas forças; re-
gule o salario, fazendo que este nunca
seja inferior à satisfação das primeiras
necessidades. Nºuma palavra, crie con-
dições de acção e desenvolvimento para
todos; mas não monopolise o que pode
ser objecto do trabalho individual,
— Bis o programma que devem do-
minar os dirigentes conscienciosos dos
aggregados sociaes; eis o meio de ob-
star ás terriveis consequencias do anar-
chismo e do socialismo materialista que
nos ameaçam de todos os lados; eis,
finalmente, como se deve caminhar em
harmonia com as necessidades e ten-
dencias do nosso tempo.
Que todos os homens de coração
abracem estas ideias; que toda a alma
generosa seja d’ellas apostolo; que toda
a vontade as converta energicamente
em factos.
Perante a bandeira da civilisação,
desfraldada ao calor dos melhores
ideiaes, cumpre a todos tomar o seu
logar nas fileiras, defendendo a liber-
dade e saudando o futuro! …
MUNDO EM FORA
Prohihição da venda de tabaco
Ultimamente, no Estado de Tennesse
(Estados-Unidos), publicou-se um decreto
prohibindo pura, simples e absolutamente a
venda de cigarrilhas.
Os democratas americanos, não crendo
na efficacia da propaganda nem na das ins-
tituições philantropicas estabelecidas para
combater o nso e abuso do tabaco, empre-
garam proccessos imperialistas, prohibindo
auctorariamente o que póde prejudicar uns
e beneficiar outros.
Attendendo-se à lettra do decreto, de-
duz-se logicamente que, no Estado do Ten-
nesse, não se vende o tabaco em charutos,
fio, picado ou para mascar, surprehendendo
-extraordinariamente o não o haver sob esta
ultima reforma, attento os habitantes do lit-
toral do Pasifico e do Athlantico o utilisarem
profusamente em tal especie. Parece indis-
cutivel que, n’aquelle territorio, só se gas-
tavam cigarrilhas.
Depois do decreto, fecharam os kiosques
e tabacarias, porém os americanos sophis-
-mam a lei: os fabricantes são chamados às
casas particulares e ahi, por meio de ma-
chinas aperfeiçoadas, preparam, em pouco
tempo, uma quantidade enorne de cigarrilhas.
GAZETILHAS
Alguns leitor’s se queixaram
E afinal tendo razão,
Pois virgulas não acharam,
Cá na minha produeção
Que foi aqui publicada,
Na quinta feira passada.
Mas a culpa não foi minha,
Do revisor tambem não,
Muita virgula ella tinha
Ao sair da nossa mão.
Posso dizer sem receio :
— Perderam-se no correio.
Providencias vou pedir
Nºeste tão bicudo caso,
E não hei-de consentir
Que receham com atrazo
Ou não lhes vá ter á mão
Dos versos a pontuação.
Joli.
id AS O
ECHOS DA SEMANA
———
Despachos judiciaes. Dr. João Lobo de
Moura, juiz de direito de Abrantes, trans-
ferido para a comarca da Certã.
– Dr. José Maria Pedroso Barata Reis,
juiz de direito do Cartaxo, promovido a
1.º classe e nomeado para Elvas.
Dr. Augusto Mendes Barata, juiz de
direito do Fundão, idem a 1.º classe e:
nomeado para Abrantes.
— Está a concurso a egreja de Belem
de Retazo, concelho de Castello Branco.
— Foi nomeado lente cathedratico da
Universidade, o sr. dr. Affonso Costa.
— Dizem diversos jornaes que o povo
do concelho de Sant’Anna, ilha da Ma-
deira, se revoltou contra o lançamento da
contribuição predial de 1898.
Os amotimados tentaram lançar fogo
ás repartições.
As contribuições não estão muito ele-
vadas…
— Está aberto concurso pelo espaço
de 30 dias para provimento dos logares
de delegados.
— Foi nomeado parocho da freguezia
de Sant’Anna da Cumeada, dºeste conce-
lho, o sr. padre José Marques de Macedo.
— À camara municipal dºeste concelho,
representou ao governo de Sua Magestade,
pedindo auctorisação, para que dos fundos
da nação possa ser desviada annualmente,
a quantia de 6026628 réis, para paga-
mento do juro e amortisação á Compa-
nhia geral de credito predial portuguez.
— Foi approvada superiormente a gra-
tificação de 5oxpooo réis, imposta pela ca-
mara ao escrivão de fazenda d’este conce-
lho, para os effeitos do disposto no art,
98.º, $ unico do Codigo Administrativo.
— Foi nomeado definitivamente ama-
nuense d’administração d’este concelho, o
nosso amigo sr. Fructuoso Augusto Cesar
Pires, que serve interinamente o logar de
secretario d’aquella repartição nos termos
do artigo 284.º do Cod. Adm.
mecenasnas@@@ 1 @@@
2 GAZETA DAS PROVINCIAS — CERTA, 2 DE FEVEREIRO DE 1899
CHRONIGA ELEGANTE
“* Anniversarios
Fizeram annos no dia 18 de janeiro,
o sr. Joaquim Marques Nunes da Costa ;
no dia 20 a ex.” sr.º D. Mariana Correia
Lima, e os srs. José Pedro Lucas de Moura
e José Marques Nunes da Costa.
Passa tambem no dia 5 do corrente o
anniversario natalício do sr. dr. Accacio
de Sande Marinha.
As nossas felicitações.
*
Sahiu no dia 27 de madrugada para
Agueda, O meretissimo juiz d’aquella com-
marca, sr. dr. Almeida Ribeiro, acompa-
nhado de sua ex.mº familia.
Foram acompanhados até a Róda, lo-
gar distante dºesta villa 15 kilometros, por
todos os empregados judiciaes, adminis-
– trador do concelho e muitos amigos do
nobre juiz.
Foi uma despedida affectuosa e por
todos os titulos condigna d’aquelle digno
magistrado que em todos os habitantes da
Certã e comarca deixa um amigo e um
admirador das suas altas virtudes.
*
Tem passado bastante incommodada
de saude a ex,” sr, D. Conceição da
Silva Baptista.
x
Esteve n’esta villa o sr, dr. Antonio
Augusto de Mendonça David, presidente
da camara munícipal do concelho d’Olei-
ros.
*
Já regressou de Portalegre o nosso
amigo sr. padre Domingos Lopes da Cruz,
digno coadjuctor d’esta freguezia.
Es
Estiveram nesta villa a semana pas-
sada, o sr. José Alexandre da Costa e
José Nunes Marinha, de Pedrogam Pe-
queno, no
RR em
NOVA FIRMA COMMBRCIAI
Sob a firma Daniel Tavares & Martins,
organisom-se em Sernache do Bom Jardim,
uma sociedade commercial, da qual faz parte
o nosso amigo sr. Antonio Martins dos San-
tos, ex-empregado do sr. João da Silva Car-
valho, d’esta villa.
Que o futuro lhe seja prospero é o que
sinceramente desejamos ao novel commer-
ciante aquem enviamos cordeaes parabens.
2 FOLHETIM
SU ENto
TRINDADE COELHO
Muitas vezes acontecia esquecer-se o
Thomé a velo comer, de candeia altenta,
encostado à mangedoira, sorrindo: e, de
cima, a sr.” Josefa tinha de intervir então,
gritando-lhe pelas frinchas do sobrado :
— Thomé, vê se te vens deitar, meu
pasmado ! olha que são horas.
E piamente, como fanatico, achava ve-
rosimil a lenda da burra que fallou, — his-
toria que uma tarde, passando, o abbade
lhe contara. Tanto que mais de uma vez,
dando ao burro as boas-noites, extranhou
com certo desgosto que o «Sultão» lhe não
respondesse :
— Boas noites |
e
o o
Mas o demonio, que sempre as arma,
armou-lh’a tambem um dia! Foi ao cortelho,
de manhã cêdo, e não encontrou o burro.
Ficou parvo! Pôz se a mirar, espantado, a
Um adeus
À memoria do meu amigo Antonio Lacerda
E
Roubou-te a morte
ainda creança,
Louca esperança
é ade viver;
quen; sabe a sorte
que está preseripta?
mais vale morrer
do que na desdita,
sofirer, sofirer,
Bem sei que é dura
tão longa ausencia ;
mas paciencia,
é lei fatal: —
na sepultura,
e sempre assim,
meiga ventura,
O vicio, o mal
vae ter seu fim.
Não te lamento,
foste feliz !
Choro sómente
quem te era caro;
mas Deus o quiz.
Por ultimo adeus
– enlaço-me ardente
nos braços teus;
e mui piamente
imploro a Deus,
que a paz do Crente
tenhas nos ceus!
Coimbra, 24-1-99,
R. F.
tio Si “Am
Sciencias & Letras
À quer de CONAN
Passeiavamos na avenida de platanos,
Jorge e eu, sem falar. Era n’uma d’essas
noites d’outomno, tepidas, suaves, dolentes,
que nos adormecem tão languidamente a
alma e fazem com que todo o nosso ser,
dilatado, desenvolvido, evolado, se junte à
tristeza crepuscular das cousas e ahi des-
falleça.
Debaixo do céu sem nuvens, onde se
ostentava a encantada melancholia do azul,
por detraz do castello antigo, cujas janellas:
não estavam ainda iluminadas, e desenhava,
em negro, a sua massa rectangular com
quatro fortes torres, a lua subia lentamente,
sem disco, branca, derramando pelos telha-
dos, no terraço, nas flores dos alegretes e
nas arvores sombrias e sobre a longinqua
paizagem a sua immensa pallidez diaphana,
semelhante a um véu de crepe de prata.
Parei, arrebatado.
All, muito perto de nós—mas natu-
loja que lhe pareceu enorme, e além de enor-
me — gelada…
— 0″ Josefa! Josefa! entrou de gritar da
rua. — O” Josefa!
A mulher assomou à janella, sobresaltada.
— Queres apostar que me roubaram o
burro, ó mulher?!
— Que te roubaram o quê? fez a gr.
Josefa, muito attonita.
— O burro, o «Sultão! »
que m’o roubaram !
E como ao tempo acudira já o Manoel,
em camisa, descalço, romperam todos tres
na gritaria, defronte do cortelho vazio:
—Á d’el-reil À d’elrei! Á d’elrei!
Até que o regedor, que era compadre,
intervindo estremunhado, pôz na peugada do
burro, mais dos larapios, os cabos que com-
pareceram.
Mas em vão! Um a um foram regres-
sandô, pelo dia adeante, e desfechando ao
Vem cá ver
peito abatido do Thomé a negra e vazia pa-.
lavra :
— Nadal…
XI
Dois annos depois. Tarde d’agosto. Ao
longe, fechando o horisonte que a eira do-
minava, as arestas dos montes quebravam-se
ralmente não nos via por causa dos ramos
das arvores que tornavam muito espessa a
penumbra — a duqueza de Couarec estava
sentada defronte d’um bosquesito de rosei-
ras desfloridas, tendo entre os joelhos uma
pequena Lula, sua filha, que ria para ella,
Havia seis dias que eu estava hospe-
dado em casa do duque e tinha muitas ve-
zes admirado a formosa senhora; nunca me
parecera tão adoravelmente extraordinaria
e pura como n’aquella noite, na suavidade
do clarão nocturno do jardim tranguillo.
Toda branca no seu comprido vestido roça-
gante que a lua cercaya d’um vêu de neve,
o busto meio inclinado com a curva d’uma
“aste esbelta de lyrio, dobrava, sob o ouro
pallido dos seus cabelos, que as caricias da
creança tinham levemente despenteado, o
seu grave e doce rosto onde a serenidade
do sorriso se extasiava de ternura, onde os
olhares tinham candura augusta que res-
plandece nos olhos pintapos das mãos vir-
ginaes. O mysterio da hora juntava a esta
visão todo o aspecto do sonho. E, quando
a duqueza, mais inclinada ainda para o seu
anjinho, forte e rosado, o beijou demorada-
mente e na fronte sobre os cabellos soltos,
senti espalhar-se em mim, como uma agua
deliciosa e fresca, o bello exemplo da im-
maculada e da infinita pureza.
Fallaria alto, sonhando? E” provavel,
Jorge disse-me ao ouvido, em tom rude,
onde tremia a colera :
— E comtudo se o raio do Senhor ca-
hisse sobre essa mulher é a esmagasse, 0
raio procederia bem ! Porque, realmente,
as (leopatras fataes, mortiferas amantes dos
escravos nuvios, e as cynicas Messalinas é
as Faustinas devassas, e essas rainhas da
França possuidas pelo sanguinolento demo-
nio da Luxuria, foram menos abominaveis
do que ella.
— Estás doido ? exclamei.
— Não. Vem.
E levou-me para o fundo mais escuro
da avenida,
Tu conheceste Albino de Cernac? Bom,
bonito, ousado, um verdadeiro rapaz, Amava
a duqueza, com uma paixão profunda, sem
limites, absoluta. Mas sem esperança algu-
ma! Sim, sem esperança alguma | Ser amado
pela sr.* de Couarec, era lá possivel? Não
era ella a mais casta, assim como a mais
bella de todas as mulheres?
Esposa perfeita, mãe admiravel, não
atravessara ella o terrivel mundo que diz
mal e calumnia, sem que nunca uma sus-
peita roçasse? Muito religiosa, além d’isso
com uma religião um pouco feroz, procu-
rando obter a sua salvação com a teimosia
de uma bretã. De maneira que, apesar da
sua riqueza e da sua belleza — a sua incom-
numa sombra egual, e embaciavam ainda o
poente as suaves, brandas pulverisações doi-
radas da ultima luz do sol. Riscos vermelhos
de nuvens, como grandes vergas de ferro
levadas ao rubro, destacavam immoveis n’um
fundo verde mar, esvaecido e meigo, raiado
de listrões de uma coloração leve de laranja.
Pequenos algodões transparentes, com alyu-
ras de neve, cortavam aqui e além, alegre-
mente, a monotonia profunda do azul. N’um
deslado, sob os castanheiros proximos, sur-
giam os telhados da aldeia, a torre branca da
igreja, as paredes caiadas da escola.
A vasta eira commum, levemente acci-
dentada, apresentava áquella hora o aspecto
tranquillo e de paz de uma grande officina
em repouso. Poucas «mêdas, » iam no fim
as colheitas : mais uma semana, duas quando
muito, e estaria tudo recolhido. Já sobre a
palha das «parvas» ou ao sopé das «mê-
das» altas, entre os utensilios da trilha e à
creançada estridula que brincava, os da la-
voura descançavam — vermelhos da soalheira
intensa de todo o dia, alguns deitados, em
mangas de camisa, peito nú, arregaçados os
braços musculosos, n’uma prostração rega-
lada de matilha que alfim tem a sua hora de
socego, após um dia de caçada, Parecem
prostrados da fadiga os proprios malhos, os
pativel belleza — a solidão fizera-se pouco
a pouco em torno della. Ella acceitava e
gostava d’este isolamento. Longe dos ho-
mens, estava mais perto de Deus. Quando
consentia, a pedido do seu marido, em ap-
parecer n’alguma festa vinha tarde e reti-
rava cedo, enfastiada, um pouco severa; à
a sua aftabilidade mundana, visivelmente, *
era apenas uma resignação da sua austeri-
dade; por causa disso, misturava-se um
certo mal estar ao respeito que inspirava ;
quando estava presente, sentia-se frio como”
se estivesse n’um quarto onde houvesse uma
estatua de neve.
Pois bem, essa mulher, uma noite, de
repente, — foi aqui, sim, n’este castello onde
estamos — essa mulher disse a Albino de
Cernac, muito depressa, muito baixo, offe-
recendo-lhe uma chavena de chá: «Quero.
Esta noite. No meu quarto.» E n’essa noite,
com o arrebatamento d’uma paixão larga-
mente contida e orgulhosa de poder final-
mente confessar-se, entregando-se a elle,
inteiramente, como merecera, como obtivera
sem o pedir! —a realisação repentina do
seu desejo mais devorador, era 0 que elle
não comprehendia, e não procurou compre-
hender. Ajoelhava-a maravilhado; e ella, na
impudencia soberba da sua alegria; «Sim,
sim, adoro-te.» Mas quando o dia estava
quasi a apparecer, assaltaram-a receios. Se
elle fosse, sahindo do quarto, fazer barulho
na escada, acordar alguem ? Era terrivel só
O imaginar isto. Que fazer? Então Albino
pensou na janella. Uma loucura. O quarto
da duqueza era no segundo andar da torre
da esquerda, e por debaixo da janella —
olha, podes vel-a d’aqui — abre-se profun-
damente o antigo fosso para onde rolaram
as pedras das fortificações arruinadas. Fugir
por alli, impossivel. Mas não, possivel, facil
mesmo graças a uma precaução que ella
tomara. De um armario tirou uma comprida
corda enrolada como um cabo de navio —
-uma corda de seda, delgada, solida. Albino
não hesitou, era valente, sentia-se agil, ro-
busto. A corda foi atada ao rebordo da ja-
nella; elle saltou 0 parapeito — depois do
insffavel beijo de despedida — e começou a
descer ao longo da muralha, no crepusculo,
com os olhos levantados para ella, que se
debruçava, adoravel, no meio dos seus ca-
bellos soltos. Para a olhar ainda, esquecia
tudo, a corda que podia quebrar, o sombrio
abysmo aberto. Mas repentinamonte, viu lu-
zir alguma coisa entre os dedos da duqueza!
e ella cortou a corda e o desgraçado, ca-
bindo duma altura de quinze metros, es-
cangalhou o craneo nas pedras do fosso.
Tinha ouvido sem interromper ; por fim
disse :
— Isso não é verdade?
trilhos, as pás, os «balaios » que levaram
todo o santo dia varrendo o chão em volta
das «parvas.» E aqui e alli, dando uma
sensação agradavel de fartura, perfilam-se os
altos saccos no meio das rasas, extravasando
de grão. Além, gente em mangas de camisa,
ao redor de um grande montão de palha tri-
lurada, vae «limpando» —- visto que sopra
um «ventinho.» E sente-se sobre as pás a
chuva do grão, ao mesmo tempo que a pa-
lha, voando, faz monte da outra banda, e os
«balaios,» em mãos de mulheres, não ces-
sam de arrebanhar o grão, varrendo em roda
n’um afan… Em certo ponto, carros va-
sios; um além, de aitissimas cangarellas,»
vae-se enchendo de palha; emquanto outros,
atulhados de saccos, em rimas entre as can-
cellas mais baixas, estridulamente chiando
abalam para as tulhas, levados pelos bois
gigantes.
Eiras além, livres dos trilhos que ficavam
em cima da palha, levas de bois caminhavam
vagarosamente, as largas orelhas pendentes,
caudas oscilantes afagando nas ancas espa-
cosas O luzídio pêllo. E lá vão encosta abai-
Xo, roçando pelos troncos asperos dos cas-
tanheiros a enorme corpolencia, fartar 0 largo
bandulho à serena agua das ribeiras, sor«
Yendo vagarosamente, impando a cada SOrvos@@@ 1 @@@
GAZETA DAS PROVINCIAS — CERTA, 2 DE FEVEREIRO DE 1899
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— Um pouco depois do nascer do sol, Recreio condessa dOleiros e seu ex.”º filho, o sr. CHARADA.
um creado ouviu fracos queixumes. Corre- No domingo passado, esteve tocando na | Conselheiro Albuquerque. Neste concelho
ram, levantaram Albino muito ensanguen- | Praça do Commercio a phylarmonica desta | é esta a freguezia que maior auxilio presta. (AB…)
tado. Com uma voz que ia extinguir-se,
murmurou que, passeando pela manhã em
roda do castello, tinha escorregado no re-
bordo do fosso. Mas eu fiquei só, perto de
elle, no quarto onde o deitaram, e prestes
a morrer confessou-me tudo.
— Não! Para que commetteria a du-
quega esse crime ?
— Os mortos não fallam.
— Oh! isso é horrivel !
Duvidas ainda? pois ouve, a duqueza
está alli. Yae ter com ella e diz-lhe, como
por acaso, esta phrase banal, vendo-a beijar
a filha: «E” muito feliz minha senhora, e
digna da sua felicidade. »
— Para que hei de falar-lhe assim ?
Pensas que ella se perturbará?
— Tu verás! tu verás!
Fiz o que elle queria. Depois d’algumas
palavraspronunciei a phrase que elle dissera
e estava bem convencido de que a duqueza
se não commoveria |! Nenhuma perturbação
com effeito; ella sorriu docemente, e vol-
tando para mim os seus bellos olhos :
— Digna da minha felicidade? não, mas
sou protegida.
— Protegida ?
— Por Deus, primeiramente, e depois
por um talisman que possuo. Nós outras,
as bretãs, sabe, sômos um pouco supersti-
ciosas. Olhe, veja o que me dá felicidades,
accrescentou, com o sorriso ainda mais
suave, os olhos ainda mais tranquilos.
E mostrou-me um singular bracelete
que tinha no pulso direito — um bracelete
feito d’um pedaço de corda de seda; e tor-
nou a beijar os cabellos de Lula.
Fugi. Juntei-me a Jorge. Disse-lhe :
— Porque não denunciaste esta mulher
infame ?
— Porque a amo! respondeu elle com
uma voz surda, onde se estrangulava um
soluço, e porque, talvez um dia, ella queira
commetler outro crime !
Catulle Mendéz.
VARIAS NOTICIAS
Audiencia geral
Foi addiada a audiencia geral que devia
ter logar no dia 31 de janeiro, por faltar
uma das testemunhas d’accusação, e, em
que são réus João Antonio Livreiro e Mar-.
tinha Matheus, conhecida por Martinha Se-.
gunda, d’Oleiros, accusados pelo crime de
furto.
villa, proporcionando-n’os uma boa tarde de
recreio. Oxalá que não seja a ultima vez
que alli vejamos esta sociedade, afim de
sahirmos do aborrecimento em que ha muito
jazemos.
Carnaval
O carnaval promette estar este anno
muito animado por aqui. O enthusiasmo
tem-se notado por alguns grupos de mas-
carados que ultimamente têm apparecido
pelas salas e nas ruas.
Operação
Ha poucos dias foi feita uma raspagem
da tibia e peronea a um filho do sr. Josê
Custodio Vidigal, de Pedrogam Pequeno,
que ha um anno sofíria d’uma osteite. Ope-
raram os illustres professores da nossa Uni-
versidade, srs. drs. Daniel de Mattos e João
Jacintho.
A” operação, que correu bem, assistiram
os srs. Henriques David e João Malheiro,
distinctos quintanistas de medicina.
MARCO POSTAL
Oleiros, 29. — Novidades de sen-
sação ou noticias de interesse, nenhumas.
Estes ultimos dias tem feito frio que arre-
pia.e soprado rijo, vento que corta; como
consequencia geram-seé-nos as teimosas friei-
ras, e, procurando abrigar-nos ao canto da
lareira, deixamo-nos sem custo vencer pela
atrevida preguiça. Hoje, por “um esforço
d’essa vontade que sára os enfermos e obra
tantos mil prodigios, nada direimos de apro-
veitavel; no emtanto, afugentaremos por um
pedaço esse pernicioso vício, consumidor das
horas da nossa existencia.
— Em virtude da circular enviada pela
direcção geral de instrucção publica aos go-
vernadores civis dos differentes districtos,
se dirigiram estes magistrados às camaras
municipaes e estas, por sua vez, ás juntas
de parochia, a fim de se averiguar com que
auxilio poderá o governo contar da parte
destas corporações na construcção dos pro-
jectados edificios escolares.
A camara deste concelho, para a con-
strucção de edificios para ambos os sexos,
desta freguezia, offerece o terreno neces-
sario, em local bem apropriado; a junta de
parochia, 305000 réis em dinheiro, o ser-
viço de 494 homens, 148 carros de bois,
a 2 dias de trabalho; diferentes particula-
res promovem uma subscripção concorrendo
com importantes quantias a ex.”º gr.º Vis-
— São julgados no dia 31 do corrente
os auctores do furto ao nosso amigo João
Martins.
— Realisou-se a festividade de S. Se-
bastião e no proximo dia 2 realisa-se a da
Senhora das Candeias.
G.
AGRADECIMENTO
Antonio Nunes Damas agradece profun-
damente penhorado a todas as pessoas que
se dignaram acompanhar à ultima morada
sua presadissima thia Maria do Patrocinio
Damas; e em especial ao sr. Augusto Rossi,
que desinteressadamente e a meu rogo reali-
sou com zelo inegualavel o funéreo prestito,
Lisboa, 30 de janeiro 1899.
cmi mm
LOGOGRIPHO
Mulher — 6, 8, 6, 3.
Mulher — 7, 4, &, 2,
Mulher — 2, 8, 6, 2.
Cidade — 9, 5, 1, 8, 2.
Rio — 44, 40, 1, 2.
Como prova d’amor
Olfreço-te esta flôr
A moda,
ai dim
ENIGMA
Ao Fructuoso
Veja este enigmasito
Que apresento:
Vae morrer coitadito,
N’um momento.
Tem lettras quatro e não mais
Ouça bem,
Sendo duas as vogaes
Que contém.
Póde ser apellido
Ouviu?
E fructo conhecido?
Cahiu ?
Instrumento tambem
Decifrou ?
E é verbo, veja bem
— Já matou,
Silvadeas.
—— mp
Longe, bem longe, tão de mim distante
Nem um instante me esqueço-de ti;
Assim te lembres do pedido santo
Que eu triste tanto te implorei aqui.
Não ‘squeças, pois, nunca, tal promessa,
Já que foi essa a ultima vontade
De quem tão triste assim te comprimenta — 3
Na dôr eruenta desta soledade — 4,
Que de lembranças d’um bem que passou
Que não voltou e nem volta mais!
— Lembrança eterna que n’ausencia existe
Que d’alma triste não sairá jámais.
P.
DECIFRAÇÕES
Do Logogripho — Miseravel.
me
CORREIO DA «GAZETA DAS PROVINCIAS”
Temos em nosso poder algumas pro-
ducções litterarias que ainda não poderam
ir n’este numero, pelo que aos seus aucto-
res pedimos desculpa.
— Ào nosso assignante sr. Antonio Nu-
nes Damas, enviâmos já o n.º 10 da Gazeta
das Provincias.
— — dor. Januario da Matta Martins, da
Lagôa, (Algarve) agradecemos a sua inseri- –
pção no numero dos nossos assignantes.
e o jim
RKRALENDARIO DE FEVEREIRO
Quarta-feira 1 So je
Quinta-feira 20/16/95 | —
Sexta-feira 3 [10/17/24] —
Sabbado 4 [11/18/25] —
Domingo o [12/19/26] —
Segunda-feira 6 /13/20/27| —
Terça-feira 7º ARO OR
Quarto minguante E a 2.
Lua Nova & a 9.
Quarto crescente D a 19.
Lua Cheia & a 26.
cc ee
As creanças terriveis:
— O? papá, comer maçãs não é pec-
cado, pois não?
— Não, minha filha.
— Então porque é que Adão e Eva fo-
ram expulsos do paraizo por terem comido
uma maçã?
*
Um garotito apanha uma ponta de ci-
garo.
— Pois tu és capaz de fumar isso? per-
guntou lhe um outro.
— Eu! então julgavas que eu fumava
esta « beata!» Isto é para vender!
pesadamente, monotonamente, parece que
insaciaveis no meio da agua em que se ato-
lam, submissa…
Ao fundo da eira, rente aos castanheiros
escuros, um rancho de mulhrres cantava ale-
gremente, em côro. Acabara de ensacar-se
o ultimo grão da farta colheita do Thomé da
Eira.
— Colheita rica, sim senhor | vinham di-
zer-lhe os visinhos. —A primeira da aldeia!
— Qual ? isso sim ! vão vocês ver a tulha,
Muita palha, é que vocês hão de dizer, muita
palha e pouco grão…
E muito azafamado, sem prosapias de
maioral nem geitos de soberba, as mangas
arregaçadas pelos cotovelos, o Thomé ia e
vinha, dando ordens, repetindo avisos, dis-
tribuindo aqui e além as ultimas tarefas.
— Ahi vae um sacco, 6 tu! E p’r’as
«rabeiras.» Que não fique nem um grão,
ouviram? É aviar, toca -a aviar! Cautela
que não fique por ahi alguma coisa esque-
cida: essas pás, esses «Daleios,» Ludo isso.
Margarida! 6 Margarida! qu’é da tua rasa?
Deixa! se vae no carro está bem.
– E era como um doido a metter-se no ser-
viço de todos, muito expedito. loquaz, ale-
gre, pedindo pelas bentas almas que se não
deixassem agora dormir. ..
—YVamos lá! vamos lá! As pás, tu que
Cantas? Deixa-me por ahi alguma, que eu
depois te ensinarei, ouviste? — Que faz ahi
no chão esse «rasouro, » O coisa? — Olha
pr’o que estás a fazer, tu: esses saccos que
fiquem bem atados.
O criado, que ia abalar com a carrada,
perguntou, já de «aguilhada» no ar, se era
preciso mais alguma coisa.
— Não, podes ir, Ouves? lá em casa
que tenham a ceia a horas. Avia-te. Quves,
Francisco? Não piques os bois, a carrada
é valente. A passo, deixa ir os animaes a
passo. Vae-te.
Como o carro chiava, levantou a voz para
dizer:
— Olha, descarrega na tulha do meio.
Na tulha do meio, não ouves? Os bois para
o lameiro.
Mas o Francisco apontou dois saccos que
ficavam: —« seria preciso vir por elles? »
— Não vale a pena, lá irão.
E depois, para aquella gente, observou
que bem sabia elle quem os levava, aquelles
dois saccos…
– — Com mil demonios! Apostar que vo-
cês não advinham ?
« Elles sabiam lá? … Quem quer po-
dia levar os dois saccos, olhem agora! »
— O «Sultão,» sabem? o «Sultão!» Esse
é que os levava. E digo-vos então que va-
lia o dobro a colheita, assim me Deus salve!
Alguns riram da lembrança. «Tinha gra-
ça que a scisma do animal não lhe passava
– pem à mão de Deus Padre!»
— A modos que isso é já mania, 6 sr.
Thomé?
N’isto, porém, o lavrador soltou um «oh!»
de surpreza. Voltaram-se todos — «que era?»
Na estrada que a eira dominava, um homem
ia passando, a cavallo.
“Vocês não querem vêr, Ô rapazes?! per-
guntou o lavrador, fazendo-se pallído. —
Aquelle burro, hein? se não é o «Sultão» é
0 diabo por elle…
Recordaram:—«estrella malhada na testa
e a mão direita branca…»
— E elle, com um milhão de diabos! não
ha que vêr! E aquelle é o ladrão!
E cuspindo nas mãos, e arregaçando mais
as mangas da camisa, arrancou, d’um aba-
não, o cabo d’uma «espalhadoura» e botou
a fugir direito à estrada.
Prestes ouviu-se um berreiro, as mulhe-
res do rancho em alarido :
— Que o mata! gritavam todas. — Ai
que o mata! Acudam! Ai a desgraça! Nem
a alma lhe deixa! Acudam!
Os homens deitaram a correr atraz delle,
aliluia gente de todas as bandas da eira, os
cães ladravam.
— Então, sr. Thomé? olhe que se perde,
sr. Thomé! diziam-lhe, já agarrados à elle.
— Largue 0 cabo, que se desgraça! Tudo
se faz a bem, sr. Thomé, largue vossemecê
o cabo!
— Qual bem nem qual diabo! Qual lar-
ga? Arreda! Racho-lhe as costellas, mais
a vocês, se me não largam! Arreda!
E esbracejava furioso, levando-os de rol-
dão, agarrados a elle mais ao cabo. Chegou
a ferir um, os outros desanimaram por in-
stantes.
—Vê, sr. Thomé?!
« Não via nada, não queria vêr cousa ne-‘
nhuma! Arreda!»- E n’um rompante de
ira, abrindo brecha com um « sarilho,» de
um pulo saltou à estrada, aos tropeções nas
pedras que encontrava, mal se equilibrando.
— Abaixo! intimou. —Você é um ladrão!
— Um quê ?
— Um ladrão! E” meu esse burro! Hei-
de matal-io aqui, seu patife! Deixem-me!
larguem-me! Ha-de ahi ficar estendido, como
um cão!
Continta.ta.@@@ 1 @@@
GAZETA DAS PROVINCIAS — CERTA, 2 DE FEVEREIRO DE 1899
SERVIÇO DE DILIGENCIAS
Da Sertã a Fhomar (via Serna-
ghe do Bom Jardim, Valles, e Ferreira do
Zezere). Sahe da Certã às 2h. da t. e chega
a Thomar às 9h. da noite; Sabe de Tho-
mar às 5 da m. e chega a Certã às 12 1/o
da tarde.
Da Certã a Proença a Nova.
Sahe da Certã à 4 1/o da t. e chega a Proença
às 5 da tarde; Sahe de Proença ás 5 da m.
e chega a Certã às 9 1/a da manhã. Esta
diligencia communica com a de Proença a
Castello Branco.
Da Certã à Peilrogam Pe-
queno. Sahe da Certã às 2 da t. e chega
a Pedrogam às 5 1/o da tarde; Sahe de Pe-
drogam às 7 da m. e chega a Certã ás 10
da manhã. :
A NNUNCIOS
A rrematação
(1.º annuncio)
No dia dezenove de Fevereiro pro-
ximo futuro, por onze horas da manhã,
à porta do Tribunal Judicial d’esta Co-
marca, por virtude da execução que o
Digno Magistrado do Ministerio Pu-
blico como representante da Fazenda
Nacional move contra o refractario José,
filho de Manoel da Costa e de Anna
Maria, do logar do Valle da Gallega,
freguezia de Pedrogam Pequeno, se ha
de arrematar em hasta publica pelo
maior lanço offerecido sobre o preço da
avaliação — Uma terra de semeadura
com agua, com oliveiras, videiras, cas-
tanheiros, sobreiros e testadas de mat-
to, sita à Fonte Maria Maia, limites do
Valle da Gallega que foi avaliada na
quantia de cento e quarenta mil réis.
Pelo presente são citados quaes-
quer credores incertos, nos termos le-
gaes.
Certã, 21 de Janeiro de 1899.
O Escrivão,
Antonio Joaquim Simões David.
Verifiquei a exactidão
O Juiz de Direito substituto,
Erhardt.
ARREMATAÇÃO
(1.º amnuncio)
No dia vinte e seis de Fevereiro
proximo futuro, por onze horas da ma-
nhã á porta do Tribunal Judicial d’esta
Comarca, por virtude da execução que
o Digno Magistrado do Ministerio Pu-
blico, como representante da Fazenda
Nacional, move contra o refractario
José, digo contra 0 refractario.Antonio,
filho de Manoel Lopes e de Maria de
Jésus, do logar do Cimo do Valle, fre-
guezia do Proviscal, se ha de arrema-
tar em hasta publica pelo maior lanço
offerecido sobre o preço da avaliação ‘
— Uma terra de cultura com oliveiras
e testada de matto, sita 4 Cór do Gil,
limites do Cimo do Valle, que foi aya-
liada na quantia de sete mil e dusentos
rés,
Pelo presente são citados quaes-
quer credores incertos, nos termos le-
gaes.
Certã 27 de Janeiro de 1899.
O Escrivão,
Antonio Joaquim Simões David.
Verifiquei a exactidão
O Juiz de Direito subslituto,
Erhardt.
MESTRE DE MUSICA
Precisa-se devidamente habilitado
para reger uma philarmonica na Certã,
e que saiba tocar instrumentos de corda,
Carta dirigida ás iniciaes A, D. F.
CERTA,
Harpa
Vende-se uma harpa, de
Erard, sete pedaes, movimento
simples e em bom estado de con-
servação.
Quem pretender dirija-se a
Antonio Victor da Rocha.
CERTA.
João Marques dos Santos
FLORES DE MAIO
(Versos)
Um vol. Preço 400 réis.
Vende-se nas livrarias.
PROCESSO DREYPUS
CARTA Á MOCIDADE
POR
EMILIO ZOLA
Preço 50 réis
Acaba de sahir do prélo este vibrante
opusculo dirigido à mocidade academica.
Vende-se nas livrarias.
GUEDES TEIXEIRA
BOA-VIAGEM
POESIA
dita pelo auctor na recita de despedida
do quinto anno juridico de 97-98
Preço 200 réis
Vende-se no Porto, Empreza da ARTE
Editora.
SELLOS USADOS
Compra-se qualquer porção por bom
preço.
Dirigir-se a
AUGUSTO COSTA
Alfaiate
Encarrega-se de fazer todo o serviço
concernente à sua arte, tanto para esta lo-
calidade como para fóra.
Garante-se o bom acabamento.
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comarca.
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Historia dos Juizes ordinarios é de paz
: POR
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do Instituto de Coimbra
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Vende-se na livraria França Amado —
Coimbra,
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David Nunes e Silva, com officina de pyrothechnia, encar-
rega-se de fornecer para qualquer ponto do paiz fogo d’artificio,
com promptidão e garantido acabamento.
Na sua officina, encontra-se sempre um grande e variado
sortimento de fogo de estoiros, e foi della que sahiu o fogo
queimado nos centenarios: — Antonino — de Gualdim Paes —
e da India, — (n’este sómente o de estoiros e balõas), cujo
effeito tem sido applaudido pelo publico e imprensa.
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garantindo-se a sua perfeição e nitidez.
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d’este concelho, mediante ajuste especial
Quem pretender dirija-se a LUIZ DIAS, Praça do Com-
mercio. —OERTA.TA.