Gazeta das Províncias nº19 23-03-1899
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ANNO |
CERTÁ — Quinta feira 23 de Março de 1899
)
N.º 19
Semanario independente
A SSIGNATURA.
CERTA, mez, 400/75. FÚRA DA CENTÃ, trimestre, 330 75. AFRICA, semestre, 4$000 15. BRAZIL, semestre, 28500 rs. Numero avulso, 30 rs.
“Toda a correspondencia dirigida 4 Administração, R. Sertorio, 17. Os originaes recebidos não se devolvem
Ernesto Marinha — Director
ae
MA
FUBLICAÇÕES
No corpo do jornal, cada linha 80 rs. Annuncios, 40 rs. a linha. Repetição, 20:75. a linha. Permanentes, preço convencional ; os srs. assignantes
têm o desconto-de 25 0/p. Esta folha é impressa na Imprensa Academica, R. da Sophia, Coimbra
Augusto Rossi — Editor
ORIGEM HISTÓRICA
CRETA:
I
Um dos periodos da historia do nosso
paiz, mais notaveis e dignos de estudo,
é, certamente, o dessa lucia gigantesca
e porfiosa, sustentada pelos lusitanos, na
defesa da sua liberdade e independencia,
contra às aguias romanas, que nessas
eras avassalavam o mundo. São glorio-
sissimos para esta, boa terra os annaes
d’essa lucta, pelo esforço, patriotismo e
dedicação de seus filhos. Os lusitanos
não só defenderam palmo a palmo, com
extremado valor, o sólo da patria, mas
praticaram ao mesmo tempo os mais subli-
mes exemplos de todas as virtudes civi-
cas, de que se póde ufanar qualquer povo
culto. Não tinham, é certo, a perícia dos
generaes romanos, nem a disciplina das
suas legiões, nem o auxilio das suas ma-
chinas de guerra. Desconheciam as scien-
cias, as artes, 0 luxo e até as commodi-
dades da vida. E em razão d’esta igno-
rancio os seus inimigos lhes davam o
epitheto affrontoso de barbaros e selva-
gens. Mas, em compensação desses dotes
esplendidos, que faziam o orgulho de
Roma, possuiam os lusitanos, no grau
mais eminente, o amor da independencia,
e o valor e coragem dos que combatem
ela terra, que lhes serviu de berço, pela
hordáde, que lhes consagra e assegura
seus fóros, e pelos lares em que se con-
centram seus bens, suas alfeições e feli-
cidade. O esforço do animo e do braço
suppria n’elles todas essas condições de
sciencia e de arte, que faziam quasi
sempre invenciveis os exercitos de Roma.
E a tal ponto de encarniçamento chegou
a guerra na Lusitania; tão obstinada re-
sistencia e tão grandes perdas aqui ex-
perimentaram as legiões romanas, que a
orgulhosa senhora do orbe antigo já lhe
custava a encontrar generaes, que viessem
de bom grado affrontar as iras dos lusi-
tanos.
Porém, que resistencia podia haver
que acabasse por triumphar dessa rainha
do Tibre, que do alto do Capitolio via
rendidas a seus pés todas as nações desde
o Euphrates até ao Atlantico, e desde o
Nilo até ás columnas de Hercules? A
Lusitania foi durante annos um vasto ce-
miterio das legiões romanas. Mas, por
fim, a perseverança e o immenso poder
dos invasores sujeitaram toda a Lusitania
ao jugo de Roma.
Não gozaram os conquistadores por
muitos annos da posse pacifica da sua
conquista, obtida a troco de tanto sangue.
e tão grande dispendio.
Sertorio, capitão valente e arrojado,
nz fa
sendo proscripto em Roma por ter se-
guido o partido de Sylla, na guerra civil
que então dilacerava a capital da repu-
blica romana, vem refugiar-sé na Lusi-
tania, e ahi levanta o brado de indepen-
dencia da terra hospitaleira, que o rece-
bera e agasalhára como a seu natural.
Os lusitanos, encontrando no seu novo
chefe a sciencia da guerra, que lhes fal-
tava, e o conhecimento da estrategia dos
generaes romanos e da politica e organi-
sação da civilisada republica, preparam-
se convenientemente para a lucta: sahem
a campo cheios de enthusiasmo e con-
“fiança: combatem com incrivel ardor e
“caminham de victoria em victoria, fazen-
do-se cada vez mais temiveis aos seus
poderosos inimigos.
A intelligencia e actividade de Ser-
torio não se gastam exclusivamente na
guerra. Ao seu aceno levantam-se as
muralhas de Evora com que fica bem
guardada a cidade, que escolhera para
capital. Adorna-a com monumentos que
fazem florecer as artes. Funda cidades
e fortalezas, com que augmenta os meios
de defensa do paiz. Estabelece ou ar-
raiga por toda a Lusitania aquellas fortes
“instituições, aquella robusta organisação
que constituíam as fontes do poder e do
esplendor da republica romana.
H
Durante estas porhosas guerras, veio
um exercito romano sitiar uma cidade
que Sertorio fundára havia pouco, pon-
do-lhe por nome — Certago,
Assim que o inimigo assentou os seus
arraiaes, acommetteu a cidade cóm en-
tranhado furor. Era tão grande o odio
dos romanos contra Sertorio, todos se
julgavam tão obrigados a vingar no seu
sangue as injurias por elle feitas à patria,
e as affrontas por cada um recebidas no
campo da batalha, que só a idéa de terem
diante de si uma obra do seu irreconei-
liavel inimigo, lhes excitava vivamente 0
desejo da vingança e lhes dobrava o es-
forço. Re
Portanto, ao primeire ataque seguiu-
se segundo, ao segundo terceiro, e sempre
com a mesma senha e vigor dos assal-
tantes.
Sertorio estava longe d’alli e a sua
Certago não tinha defensores bastantes
para guarnecer a extensa cerca de mu-
ralhas que protegia a cidade. Todavia,
o valor e a intrepidez suppriam o numero.
Bem sabiam os siliados que não de-
fendiam sómente a honra das suas ban-
deiras, os interesses e a gloria do seu
chefe, e a independencia da sua patria;
mas sim tambem a existencia da sua ci-
dade, que os romanos não deixariam em
pé se a tomassem; as suas vidas, que
seriam ainda poucas para Saciar o rancor
do inimigo, e mais importante que a ci-
dade e as vidas dos seus defensores, a
castidade de suas esposas e filhas, que
seria infallivelmente sacrificada à bruta-
lidade dos vencedores.
Armados, pois, os seus braços por
tão poderosos interesses, e robustecido o
seu animo por tão santas considerações,
‘os lusitanos obraram prodigios de valen-
| tia é coragem na defensa dos muros de
Certago. Mas os assaltos eram tão repe-
encarniçamento, que não lhes sobrava
tempo para repousarem de tantas fadigas,
nem sequer para tomarem o necessario
alimento.
O plano do inimigo era combater sem
tregoas; pelejar a toda a hora, de dia e
noite, revesando as suas numerosas pha-
langes, até extenuar de forças os sitiados,
e obrigar a praça a render-se antes que
pudesse chegar-lhe soccorro de fóra. Po-
rom, O cansaço e o desalento principiavam
a fazer frequejar ao mesmo tempo os si-
tiados’e os sitiadores. Os primeiros, achan-
‘do-se reduzido a tamanho, extremo de
trabalho e de vigilias, e cada vez mais
apertados do inimigo, iam perdendo toda
a esperança de soccorro e de salvação.
Os segundos, vendo rarearem-se de dia
as suas fileiras, inuteis todos os seus es-
forços e tentativas, e a resistencia sempre
com igual obstinação, tambem começavam
a descrer da victoria.
HI
Tal era a disposição dos animos
d’ambas as partes contendoras, quasi ao
acabar do quarto assalto da cidade. A
peleja tinha affrouxado em todos os lados.
As hostes romanas já recolhiam as es-
cadas e machinas de guerra, que tinham
assestado contra os muros, e dispunham-
se para se retirarem aos seus arraiaes.
Apenas um troço de soldados se empe-
nhava ainda calorosamente junto de uma
das portas para entrar a cidade.
Quiz o acaso, que nesta lucta parcial,
em que se mostravam mais empenhados
o capricho e o odio, que a esperança de
um triumpho, cahisse morto o principal
d’aquella porta. Os soldados lusitanos
que o auxiliavam nesta empresa, Já que-
brados de animo e de corpo, esmorecem
ao vêr sem vida o denodado chefe, que
tantas vezes os conduzira á victoria. E
os romanos, alentados por este aconteci-
mento, redobram de energia e vigor, e
precipitam-se com tamanho impeto contra
a porta, que esta cede ao impulso do ini-
migo, franqueando-lhe a entrada da praça.
A onda, impellida pelo tufão, não se
arremessa contra as rochas da costa com
mais furia, do que arremetteu pela porta
dentro a hoste romana. Porém, no meio
do escuro e estreito corredor que condu-
zia para o interior da cidade por baixo
de uma grande torre, ouvindo um certo
| rumor, hesitam, param e logo depois re-
%
tidos e prolongavam-se com tal porfia: e:
guerreiro, a quem-fóra confiada a defensa
cuam os que, por mais ousados, iam na
dianteira.
Se um raio os viera assombrar, não
ficariam, por certo, mais tomados de es-
panto.e terror do que na presença de
uma mulher que lhes appareceu d’impro-
‘viso, terrivel como 0 anjo do extermibio.
| E raio destraidor, e tambem anjo da morte
‘foi para elles a coragem varonil: d’essa
mulher.
– Celinda, a esposa do infeliz guerreiro,
cuja morte facilitára aos romanos a en-
‘trada da praça; Celinda, a consorte ex-
tremosa e dedicada, mal recebe a noticia
do caso fatal, que vai cobrir de luto os
seus dias, sabedora tambem do arrojo do
inimigo, corre, fóra de si, não a prantear
a sua desdita, mas a vingar a morte do
amado esposo. Uma-certã,-cheia de azeite
a ferver, em que estava, casualmente,
frigindo uns ovos, é a unica arma que
leva nas mãos.
Mas a raiva e a desesperação, aju-
dadas das cirçumstancias locaes, conver-
tem aquelle fraco utensilio em terrivel
arma de guerra. A heroina encontra-se
com o inimigo no meio do lugubre cor-
redor por baixo da torre. Arremessa o
azeite. fervente ao rosto dos que vem
diante, e, em acto continuo, investe con-
tra elles, brandindo a certã, e descarre-
gando valentes golpes, como se fôra uma
espada.
O improviso do ataque; o estado mi-
seravel em que ficaram os da vanguarda,
completamente impossibilitados de se de-
fenderem; a estreiteza do corredor, que
impedia aos da retaguarda a passagem
para a frente; a escuridão do lugar, que
não deixava distinguir a qualidade ou
força da aggressão; e, finalmente, o de-
nodo, acerto e lortuna com que a illustre
matrona soube manejar a certã; tudo isto
embargou o passo aos romanos pelo
tempo preciso para chegar soccorro, com
o qual foi o inimigo expulso, e novamente
fechadas as portas da cidade.
D’ahi a poucos dias, levantaram os
romanos o cerco e ficou a praça desaf-
frontada de inimigos pelo corajoso feito
de uma mulher.
Para eterna memoria de acção tão
heroica tomou aquella cidade por brazão
de armas um escudo, e n’elle figurada
uma certã, tendo em torno este mote la-
tino: Certago starmit certagine hostes; O
que diz em vulgar: Com a certã destruiu
Certago os seus inimigos.
Esta nobre e antiquissima povoação,
que, no correr dos seculos, tem passado
por muitas vicissitudes de prosperidade
e decadencia, é hoje a villa da Certa, no
districio administrativo de Castello Bran-
co. Conserva ainda o seu antigo brazão
de armas.
J. de Vilhena Barbosa.sa.@@@ 1 @@@
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GAZETA DAS PROVINCIAS — CERTÃ, 23 DE MARÇO DE 1899
| Dr. Lino Netto
Vamos em breve encetar a publicação em
folhetim dum primoroso trabalho sociologico
d’este nosso presadissimo e querido amigo,
intitulado Principios novos de sciencia penal.
Obedece, no seu conjuncto, .a uma orien-.
tação modernissima, em que: por vezes re-
salta uma caracteristica originalidade.
Cremos convictos que os nossos leitores
nos agradecerão esta feliz lembrança por mais
uma vez lhes proporcionarmos algumas pa-
ginas de finissima e substanciosa prosa, de
este nosso talentoso amigo que nos bancos
da Universidade tanto se tem evidenciado.
O dr. Lino Netto não é desconhecido
para os nossos leitores. E” elle um collabo-
rador assiduo da Gazeta das Provincias, que
em successivos artigos de fundo tão subtil
mente se tem imposto a admiração de todos,
pela rija tempera do seu bem organisado
cerebro e são patriotismo que o anima.
Fazendo paralello dos dois estudantes
mais laureados da faculdade de direito, dizia
delle ha pouco, com justiça, a Mala do Eu-
ropa :
«O Lino Netto é mais impetuoso; se o
Pedro vae manso e manso, sem elevações
de voz, o Netto lembra-me perfeitamente o
abrir d’uma torneira de onde jorra a agua
com muita força e vigor; verboso como nin-
guem, elle é ainda n’este fim de seculo cheio
de indifferencia um homem replecto de en-
thusiasmo.
Publicou ainda não ha mezes um trabalho
sobre a Hisioria dos Juizes Ordinarios, mas
d’esse livro nada posso dizer porque O co-
nheço apenas pela capa».
Registamos como nossas estas palavras
e d’aqui endereçamos ao nosso amigo, votos
sinceros pela continuação dos seus triumphos
e pelas felicidades que tanto merece.
— pe
ECHOS DA SEMANA
Perante este juizo, pediu addiamento
do serviço militar o nosso amigô sr. F.
Henriques David, de Pedrogam Pequeno;
e dispensa do mesmo serviço activo e 1.º
reserva, Daniel Simões Ladenas, de Ser-
nache do Bom Jardim.
— Foram requisitados pelo juizo de
direito á camara municipal deste concelho,
dez enxergas e vinte cinco mantas para uso
dos presos nas cadeias desta villa.
— Estão patentes até ao dia 1 d’abril
na secretaria da commissão do recensea-
mento eleitoral e no juizo de direito, as
listas das alterações feitas no livro do re-
censeamento eleitoral d’este concelho.
— Teve logar a feira dos Passos, como
noticiamos, no sabbado findo, sendo esta
sensivelmente prejudicada pela chuva tor-
rencial,
— Tem-se procedido á inspecção directa
e avaliação especial d’alguns predios in-
scriptos na matriz predial d’este concelho,
por se acharem excessivamente avaliados.
opa jpeao———
“Um novo cemiterio
Vae proceder-se à construcção dum ce-
miterio na freguezia da Cumeada, a espensas
da Junta e com a concorrencia do trabalho
manual dos seus habitantes.
A deliberação tomada sobre tal assumpto
por aquelle corpo administrativo, foi appro-
vada já superiormente e brevemente serão
annunciados os trabalhos de construcção.
Na segunda feira finda, os dois faculta-
tivos d’este partido, acompanhados do digno
administrador do concelho, seu secretario e
official de deligencias, foram ao logar desti-
nado à construcção do novo estabelecimento,
afim de procederem às observações legaes.
O cemiterio antigo além de ser muito
acanhado, está muito mal situado, porque
fica contiguo à egreja matriz e muito proxi-
mo e superior à fonte publica do logar de
Albergaria, d’onde se abastecem os seus mo-
radores e os do resto da freguezia, aos dias
de missa e festividades.
São, pois, dignos de louvor os promo-
tores de tão util como indispensavel melho-.
mento, e, com especialidade o parocho da
freguezia, cuja dedicação e amor pela sua
parochia, mostra no emprehendimento de
remover o actual cemiterio para logar apro-
priado e afastado do adro da sua egreja,
onde é o ponto de reunião e o local dos de-
vertimeutos nos dias consagrados à folgança
e ao descanço.
—— cfr
CHRONICA: ELEGANTE
Passou no dia 14 O anniversario nata-
licio da ex.mº sr.* D. Maria José da Matta
Pedrozo Barata.
*
Já regressou a Coimbra o nosso pre-
sado amigo sr. José Custodio Martins Vi-
digal.
*
Está em Pedrogam Grande o nosso
particular amigo sr. Accurcio Gil Farinha.
x
Está em Pedrogam Pequeno o nosso
particular amigo sr. Francisco Henriques
David, distincto quintanista de medicina
“da Universidade,
x
Esteve n’esta villa o sr. João Nemezio
da Silva ‘e sua ex.””* familia.
me
Está já entre nós, o nosso amigo Ze-
ferino Lucas, pharmaceutico de 1.º classe,
que avidamente era esperado por sua es-
tremosa familia e numerosos amigos.
Receba, pois, o nosso sympathico ami-
go, as boas vindas.
x
Regressou a Figueiró dos Vinhos, o
sr. Alberto Eugenio de Carvalho Leitão
e sua ex.”2 esposa e filhos.
*
– Sahiram para o Porto, os nossos ami-
gos srs. Antonio Ferreira Alberto e Luiz
Domingos da Silva.
Boa viagem.
x
Regressou a sua casa em Pedrogam
Grande, o sr. Firmino José David e sua
ex.”* esposa.
x
Está n’esta villa em goso de ferias, o
nosso amigo Antonio Rosa Mella, estu-
dante em Portalegre.
*
Realisou-se no dia 14 na egreja d’esta
villa, o baptisado d’um filhinho do nosso
amigo sr. Emygdio Xavier Magalhães,
digno pharmaceutico nesta villa.
O neophito recebeu o nome de Emy-
gdio.
*
Esteve n’esta villa a semana passada, .
o nossó presado amigo sr. dr. Nogueira
Relvas, digno administrador d’Oieiros.
*
Está em Sernache o sr. Floriano Ber-
nardo de Brito, conceituado commerciante
no Pará,
— apo
Festevidade dos Passos
Effeciuou-se como noticiamos, no dia 17
do corrente a festevidade dos Passos, com a
representação dos tragicos episodios, do Cal-
vario.
Eram 4 e meia horas da tarde, quando
principiou a festevidade, com o sermão na
egreja matriz.
Findo este, sahiu a procissão debaixo da
maior ordem, seguida d uma encrme concor-
rencia de povo. )
Como nos annos anteriores, iam na pro-
cissão as tres Marias, Magdalena e Baronica,
e muitos anjos graciosamente vestidos.
Eram 5 horas e um quarto, quando a
procissão chegou à Praça do Commercio,
logar destinado para o Encontro, e onde o
revd.º sr. padre Cruz, pronunciou um dis-
curso commovente e repassado de boa dou-
trina. Terminada aqui a cerimonia do Ea-
contro seguiu a procissão para a egreja ma-
triz, onde recolheu; eram 6 e meia horas da
tarde.
Aguardava-a já o revd.º sr. padre Cruz,
no pulpito e d’alli pronnunciou o terceiro
sermão, não menos eloquente que os pre-
cedentes,
Foi com esta oração que terminou a fes-
tevidade, que pouca differença fez da dos
annos preteritos. A concorrencia foi menos
e não sabemos a que attribuir este facto.
A phylarmonica d’esta villa, exbibin al-
gumas marchas funebres com mestria e exe-
cutou pela primeira vez um ordinario fune:
bre muito bonito.
“O andor do Senhor dos Passos, foi ar-
“tisticamente ornamentado pela ex.”* sr.º D.
Isabel Frazão, a flores naturaes e com uma
disposição de maravilhoso gosto.
Não nos consta haver desordens nem
outros factos que nos mereçam especial
menção.
* *
de
Consta-nos que o revd.º sr. padre Cruz,
sag no domingo para Figueiró dos Vinhos,
onlle vae prégar os sermões dos Passos, fes-
tevidade que n’aquelle dia alli se effectuará.
—— edi aro
GAZETILHAS
Vão entrar em discussão,
Nas córtes lá em S. Bento,
As propostas de fazenda
(Processos d’arranjar massa).
Deputados á questão,
Falla um, responde um cento,
Ainda que nada entenda,
CGomtanto que bulha faça,
D’ora ávante só se trata
De séllos, contribuições,
Licenças; é um inferno
A que nós vamos parar.
Morreu a questão da prata
E a das recomposições;
Neste assumpto mais moderno
Vae toda a gente fallar.
Vão pagar contribuição
Auto moveis, byciclettes,
Estar accordado, dormir,
Estar sentado, caminhar,
As ostras, o macatrão,
Costelletas, omelettes,
E ainda hão de descobrir
Mais coisas p’ra collectar.
=— Pra você (me diz alguem)
Vae tudo ás mil maravilhas,
Co as propostas desalmadas
Que nos vão dar mais canceiras,
Pois contribuição não tem
Lançada nas gazetilhas,
E quem Ih’atura as maçadas
Tem d’abrir as algibeiras.
— Isso é verdade oh | amigo,
Tem carradas de razão ;
Mas, se houver contribuição,
Imposta na versalhada,
Retiro á vida privada,
Nunca mais contem commigo,
Joli.
Registro bibliographico
Temos presente o n.º 4 do Atlas de Geo-
graphia Universal, com as seguintes photo-
gravuras no texto: Lisboa, Planta de Lisbou,
Porto, Bom Jesus do Monte (Braga), Coimbra,
Mosteiro da Batalha, Convento [de Mafra,
Castello de Pena (Cintra); e em separado,
um mappa colorido de Portugal (carta poli-
tica).
Agradecemos.
A” empreza desta util publicação pedi-
mos a fineza de nos enviar o n.º 2 que ainda
não recebemos.
— ni (e
Pequeno correio
Recebemos dos nossos estimaveis assi-
gnantes, srs. J. Á, de Carvalho Ribeiro e
José Nunes Mendes, de Lisboa, a importan-
cia das suas assignaluras relativas ao 4.º
semestre. Agradecemos.
No proximo numero accusaremos a re-
cepção da importancia de mais algumas as-
signaturas.
a ee
VARIAS NOTICIAS
Actor Taborda
E” esperado em Sernache do Bom Jar-
dim, no dia 7 do proximo mez d’abril. Pro-
Jectam-se n’aquella povoação grandes festejos
em honra d’aquelle eminente actor portu-
guez, havendo recita, baile, pic-nic, ete., pro-
movidos por uma commissão que não se tem
poupado a esforços para receber condigna-
mente tão illustre hospede.
Exame
Fez exame de latim 1.º parte, no Semi-
nario de Petropolis (Brazil) obtendo a clas-
sificação de distincto, o nosso amigo José
Barata, filho do sr. Francisco Barata, d’esta
villa.
Parabens ao intelligente estudante.
Madeira
Na semana finda passaram na Ribeira
Grande, junto a esta villa, 17.000 chulipas
destinadas ao sr. Thomaz da Cruz, da Praia.
Sermões de quaresma
No domingo ultimo, terminaram os ser-
mõos de quaresma, prégados pelo revd.º
padre sr. Domingos da Cruz.
CARTA DE COIMBRA
O centemario da Sebenta
Temos festejado n’estes ultimos annos os
centenarios de Camões, Henriquino, Santo
Antonio—India-—e mui brevemente vae fes-
tejar-se n’esta cidade mais um… o da Se-
benta !
Todos os que têm passado pelos bancos
da Universidade, conhecem a tal sebenta,
nome dado a uns papeluchos litographados
que saem todas as vesperas d’aula, com a
lição do dia seguinte.
Algumas ha, que de bem litographadas
que são, os estudantes levam horas a deci-
fral-a, para depois poderem lel-a corrente-
mente e assim se preparem para 0 Processo
ou Penal do dia seguinte.
É realmente engraçado o entrar-se n’uma
sebentaria; mal se chega ao limiar da porta
enxerga-se O proprietario que de lapis em
punho faz a distribuição descarregando no
livro competente aquelles a quem a entrega.
Às serventas dos estudantes sentadas em
bancos conversam animadamente, destacan-
do-se de quando em quando uma que per-
gunta :
O Penal ainda demora muito ?
Outra, que pergunta pela de Finanças,
e assim successivamente até altas horas da
noite, pois dias ha em que a ultima parte
só sae às 2 e 3 horas da madrugada.
A mocidade academica sempre prompta
à troça vae pois com O espirito que a cara-
cterisa festejar o sentenario da Sebenta, para
o que trabalham activamente commissões de
todos os annos das differentes faculdades
procurando cada um colligir elementos que
tornem a festa agradavel e jocosa.
Informam-nos que haverá carros alego-
ricos, caricaturas dos sebenteiros, etc., etc.
Que essa festa venha depressa é o nosso
mais ardente desejo, para rirmos um boc-
cado, o que nos servirá de linitivo ao cons-
tante mal que nos atormenta… o estudo.
Quantos dos nossos leitores ao lerem
estas mal alinhavadas linhas se hão de sen-
tir satisfeitos e transportados ao passado,
recordando os seus tempos de estudantes?!
Quantos haverá que dariam hoje algumas
libras para se verem envoltos na capa e ba-
tina e encorporados no cortejo da Sebenta?!
Muitos, certamente, porque nenhum dos que
por cá tenha passado, esqueceuos seus tempos
de Coimbra, os melhores da vida, sem du-
vida.
Espera-se que venham a esta cidade inu-
meros forasteiros, juizes, delegados, advo-
gados, e até ministros, e certos estamos que
se hão de regalar ao verem a engraçada
parodia.
Aos nossos estimaveis leitores que por
qualquer circumstancia não poderem assis»
tir a esta festa, tornal-os-hemos conhecedosdos@@@ 1 @@@
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GAZETA DAS PROVINCIAS — CERTÃ, 23 DE MARÇO DE 1899
res de tudo quanto se passar em o nosso
jornal.8
Tremei paes de familia, porque as festas
levam dinheiro!! As vossas aljibeiras terão
de dar liberdade a algumas notas do Banco
para ogcorrer às despezas da parodia. Não
ficarão por isso arruinados, e proporcionarão
aos vossos filhos uns bocados alegres.
Young.
a
DESGARRADAS
Quando eu morrer, raparigas,
Cantae, que vos peço eu,
Cantae as minhas cantigas,
Quero ouvil-as lá no céo.
Cantando espalham-se magoas
Lá diz o antigo rifão ;
Mas eu canto, ha muito, e trago-as
Aainda no coração,
O” Lua vae-te deitar,
Quero fallar ao meu bem,
Comtigo não posso entrar,
Tenho medo veja alguem.
Silvadeas.
rep ai
GAZETA DAS PROVÍNCIAS
(Correspondencias particulares)
Oleiros, 19 de março.
Hontem, pelas 8 da noite, acompanha-
ram-se as imagens que hoje deviam figurar
na solemnidade, às capellas que lhes são
destinadas. Ante o Senhor Jesus dos Passos,
a parte vocal da phylarmonica entoou 0 Mi-
serere a 4 vozes, composição do applaudido
regente, sr. Thomaz Patrício, e ante a im-
maculada Virgem, a Ladainha a 3 vozes, de
Perdigão.
Pelas 414 da manhã começou a missa,
officiando o bemquisto revd.º sr. padre Joa-
quim Pinto, acolytado pelos revd.º* srs. Ba-
rata Dão e Durões, Ao Pretorio discursou o
sr. padre Cesar, do Sobral, que mais uma
vez nos assegurou a natural vocação orato-
ria. Pelas 4 da tarde sahiu a procissão se-.
guida de numeroso sequito. Ao encontro da
piedosa Mãe com seu bento Flho, orou o sr.
padre Luiz. No meio d’aquella scena tão pa-
thetica em que os paes, as mães, os filhos,
os esposos, desejam apertar-se n’um unico
amplexo de dôr, de saudade, de arrependi
mento, o distincto orador, com as suas
phrases tão sentidas, pronunciadas com so-
norosa voz, fazia a uns deslisar uma lagrima
envergonhada quando a outros corriam abun-
dantes; e todos, mais ou menos compungi-
dos, mais ou menos contrictos, impetravam
o misericordioso perdão para as suas infini-
tas culpas.
No Calvario discursou o nosso bom amigo
e comprovinciano, sr. padre Durão ; foi tão
feliz e correcto na sua oração que a nin-
guem deixou duvidosa a sua elevada intel-
ligencia.
A musica, vocal e instrumental, houve-
se com regularidade; seja-nos permittido
especialisar o sr. João Custodio Serra Meeiro,
hoje, um dos musicos mais entendidos.
— Notas: Entre as creancitas vestidas
de anjo primavam a sympathica Camilla e
o innocente Joãosinho Silva, pela simplici-
dade dos seus adornos. Na varanda dos pa-
ços municipaes a gente do povo disputava
frenetica os logares, trocando-se alguns socos
entre um e outro sexo.
Cumprindo penitencias, vimos bastantes
devotos seguir a procissão arrastando-se de
joelhos. Socegada mais a povoação, obser-
vamos mirificos exercicios geodesico-calli-
graphicos: os SS eram as lettras mais per-
feitas.
Hoje, no Porto, a extremosa, intelligente
e educadissima esposa do nosso particular
amigo, sr. dr. Faria, deu à luz uma creança
do sexo masculino. Aos ternos paes endere-
– camos os mais cordiaes cumprimentos e ao
pequeno ser desejamos ampla felicidade e
risonho porvir, pelo que fazemos preces ao
Omnipotente.
G,
Sciencias & Letras
Conheci, outrora, um rapazito que dava
pelo nome de Pedro e pela alcunha de Poum!
Esta creança de seis annos, usando calças
curtas e bonnet de vellado que o tornava
muito vaidoso, era o mais extraordinario
ente do sonho e da chimera, que se poderia
imaginar! Lambusado ainda do leite materno,
de que uma gotta, às vezes, lhe pendia da
ponta do nariz, o pequeno Poum manifes-
tava a simplicidade atrevida e ingenua de
Pierrot, e a alma cheia de credulidade e de
gulodice. As orelhas, na verdade, pouco
grandes, afastavam-se como azas da sua ca-
beça de cachimbo; o nariz arrebitado, não
tinha nobreza, comtudo os olhos de um azul
avelludado de flôr e da limpidez do céu,
resgatavam amplamente as imperfeições do
pequeno Pedro, e testemunhavam que esta
ingenua creaturinha nascera sob a influen-
cia lunar patenteando-se amplamente à ima-
ginação e à poesia.
O amigo Poum, passava então os dias
no centro de um grande jardim, que sym-
bolisava para elle, nem mais nem menos
que O paraizo — paraizo das suas loucas tra-
vessuras, das suas corridas atraz das borbo-
letas ; o eden das suas golozeimas. pois que
o pomar abundava de ameixas, e a relva jun-
cava-se com os carôços dos fructos comidos;
paraizo dos seus medos quando as vespas
zumbiam, ou ao anoitecer a malta come-
cava a cobrir-se de sombras, ou quando Po-
lyphemo, grande cão de guarda, ladrava
como monstro selvagem !
Nºeste paraiso dois seres, aos olhos de
Poum completavam com Polyphemo, uma
trilogia donde se poderia tirar todos os ele-
mentos do drama, da comedia, do idyllio e
do mysterio de que o minusculo individuo,
poeta como todas as creanças da sua edade,
recreava o espirito: eram os primos Sté-
phane e Magdalena, o primo Step e a pri-
ma Mad! O resto do mundo não existia para
Poum. A primeira individualidade d’este
mundosinho era o primo Stép! Moreno, ca-
belludo, forte como um turco para os seus
dezeseis annos, ninguem melhor do que Sté-
phane equilibrava uma cadeira na extremi-
dade do nariz, nem levantava no ar uma
meza com os dentes. Era-dotado de mara-
vilhosas aptidões, disfarçava-se em selvagem
e em phantasma. Imitava a voz grossa dos
– gendarmes, do orangotango e do papão. E
que invenções travessas, surrateiras e temi-
veis o seu cerebro concebia. Algumas vezes
mettia medo a Poum ameaçando de o arre-
messar, sem compaixão, às iras de Poly-
phemo! Outras obrigava-o a impallidecer
annunciando lhe que os ladrões, penetrariam
certa noite, em casa e estrangulariam todos,
a começar por Poum! Stép, sem duvida: al-
guma, possuia o genio cruel de Caliban. Re-
presentava o mal, era o Ahrimane da paraizo
infantil do meu amigo. Poum ao mesmo
tempo que o adorava, execrava-o!
A prima Mad? Essa era a origem da
luz.e da ternura, a fada, a loura Eva d’este
Eden, o Ormuzd feminino. Symbolisava tudo
o que é doçura, belleza e bondade; encar-
nava em si as visões suaves e deliciosas.
Quantas vezes debruçada sobre o seu leito-
sinho lhe beijava os olhos somnolentos e lhe
conchegava a roupa para o seu querido Poum
dormir descançado ; depois os mil preciosos
presentinhos : bonecas feitas de trapos, em-
prestimos de thesouras para recortar estam-
pas ao pé da meza de costura; fatias de
pão barradas com dôce, canções alegres ao
pianno com o rythmo semilhante a danças
de marionettes. Ah! quanto era bella a pri-
ma Mad !
Infelizmente, nem sempre, a encantadora
prima estava presente para defender Poum
do terrivel Stép !
o ç o
N’essa manhã, por exemplo, Stép estava
de mau homor; e Poum, muito encolhido,
não tirava os olhos d’elle, sentindo um de-
licioso e atroz terror de se esgueirar sur-
raleiramente e fugir das vistas da tyranno.
Se a distancia fosse grande facil seria a fuga,
mas na presente occasião inutil tental-a, pois
O primo com duas passadas o alcançaria.
Stép, com a mão no queixo, contemplava-o
revirando ferozmente os olhos e sorrindo de
“uma maneira sarcastica e insensata; O si-
lencio era assustador. Para abrir o appetite
propozera ao joven genileman de o untar
com mel, afim do o fazer devorar pelas ves-
pas e abelhas. Em seguida imitou com rara
perfeição Polypheno, ladrando tão forte que
este do fundo da sua casa fez córo e pôz em
bulício todos os cães da visinhança. Depois
convidou o minusculo primo a assentar-se,
retirando bruscamente a cadeira deixando-o
cahir sobre as ortigas. Que mais poderia
imaginar? De repente exclamou :
– — Poum! senhor Poum! — e apoz um
certo silencio de agonia exclamou novamen-
te: Poum! eu morro de fome! E mostrava
os dentes, revolvendo ao mesmo tempo os
olhos como um’ cannibal ;
Poum ! estou persuadido que não estás
muito gordo, imagino que deves ser coriaceo,
prefereria comer coelho, perua, ou leitão.
Ora como não tenho à mão nem leitão, nem
perua, nem coelho, vou-te comer, Poum!…
Poum empallideceu e as pernas treme-
ram-lhe. De boa vontade diria: «não é ver.
dade ! Está a brincar !» porém, teve medo.
Stpé continuou: |
— Como te comerei, Poum? Esta é a
questão! Picado cru e de molho na salmoira?
Cortado em pedaços e frito? Cosido na
panella ou salé au court bowillon? E em que
molho? Em mayonnaise, em molho de to-
mates, de cebolas ou de vinagre? N’um
puré de favas, talvez, ou antes… Sem du-
vida, o que digo!… as batatas estão tão
boas n’este momento que… Não, decidida-
mente, comer te-ei Poum, como um burrego
assado no espeto!
E dizendo isto, Stép lança-se sobre a
pobre creança e n’um segundo o levou ligado
e atado como um salsichão até junto do fo-
gão da cosinha :
— Alli, te espetarei immediatamente.
(E dependurando um terrivel espeto): €
emquanto espero que o fogo te attinja vou
preparar a meza. Não chores, Poum, peço-
te, — a victima começava a soluçar baixinho
— não chores porque pódes apagar o fogo!
Stép estende a toalha na meza, dispõe
com grande ruido os pratos, corta uma fatia
de pão do tamanho da roda de um carro,
deita, dando estalos com a lingua, um litro
de vinho no grande copo ganho na feira e
que era tão largo como um vaso de flores.
Depois tirando o relogio da algibeira d) col-
lete, parece querer calcular o tempo que
gastaria em assal-o, volta-se para Poum que
principiava a tornar-se vermelho, assenta se,
cruza. as pernas e entrega-se ao seguinte
monologo em que as crueis alternativas de
esperança succediam-se, para o cordeirinho
assado ao animo mais horroroso :
— Terei tanta fome como isso? pergun-
tava a si mesmo Stép — Poderei talvez es-
perar até amanhã e soltar Poum ? Sim, mas
elle fugiria! Não, é preciso que Poum seja
assassinado ! Vou ler o meu jornal emquanto
espero. (E no momento em que desdobrava
o jornal, estacou): Tenho eu porventura 0
direito de comer este pequeno Poum, que é
tão gentil, *e gosta tanto de ameixas e de
dôces ? (Tomando um tom-de voz terrivel):
Sem duvida tenho direito a isso, porque elle
me roubou na semana passada vinte e seis
lenços de assoar e estampilhas do correio,
no valor de tres mil francos (supposição as-
saz gratuita, comtudo Poum n’este momento
julgou-se quasi culpado e se affligia de ter
praticado semilhante roubo). Coragem, aca-‘
bemos com isto, vou-te empalar !
Em vista d’esta nova ameaça Poum não
poude conter-se e começou a gritar e a Der.
rar como um possesso, que toda a casa pa-
recia: desabar com o barulho das portas e
janellas abertas. N’isto o terrivel Stép de.
repente desapparece saltando da janella para
0 jardim, na occasião em que a prima Mad
entrava na cosinha em soccorro do pobre
Poum quasi desfallecido.
o
o e
Agora livre quanto lhe era agradavel ca-
minhar, apezar do coração oflegante e dos
olhos vermelhos, pela mão de Mad ao longo
do jardim em direcção das ameixas, chu-
pando um grosso e consolador rebuçado |
Admirando o brilhantismo do sol, absorvendo
o cheiro do mel exhalado das flôres e a be-
nignidade das vespas que o não mordiam.
Longe de Stép que se escondera e não mais
apparecera ! Talvez voltasse brandindo o fa-
calhão, não era possivel, tinha sido um so-
vho, um pezadello. Como bem dissera a
prima Mad: «Era a brincar». E até lhe cha-
mara medroso.
Todavia Poum conservava-se assustado é
ainda não recobrara de todo o socego; agar-
rado ao vestido flexivel da querida prima,
levantava por vezes os meigos olhos para a
contemplar em signal de reconhecimento e
para melhor ouvir a sua voz protectora que
lhe dizia:
— Corramos Poum! vê se me agarras !
E o seu vestido volteando como uma
grande borboleta branca e elle conseguindo
sempre agarral-a: como fazia isto. N’esta
mutua brincadeira chegam ao pomar das
ameixas. Que bello aroma quente e assuca-
rado aquellas arvores exhalavam !
— Espera Poum! recommendava Mad,
come antes d’estas, que estão mais maduras.
Com tudo Poum, no meio da sua felici-
dade seutiu-se de repente deveras embara-
çado: acabava de fazer uma descoberta ter-
rivel. Sem se sentir, no auge do susto e da
perturbação, na cosinha, quando estivera
amarrado diante do fogão, tinha-se… es-
tava… Não haveria duvida alguma! as suas
calcinhas alli estavam para prova! E para
cumulo da humilhação, a prima Mad notando
0 seu ar envergonhado, exclamara :— Poum
é porco!
Então o meu amiguinho lavado em al-
grimas, que a prima procurava enxugar com
palavras consoladoras, era conduzido ao seu
quarto para se mudar de roupa. E Poum,
supplicante, repetia, prevendo a vantagem
que Stép tiraria de semilhante catastrophe :
— Não lhe digas, Mad, não lhe digas.
Mad promettia não dizer.
— Jura-me, Mad, jura-me !
Mad jurava.
Agora o pequeno Poum, vestido de la-
vado, muito animado e contente, porem,
ainda envergonhado, dizia-lhe :
— Eu amo-te, Mad, eu amo-te.
E cingindo os braços em volta do pes-
coço da: prima beijava-a com todo o ardor.
— Mad, desejo que sejas minha mulher.
Quando eu fôr homem casasei comtigo !
Ella respondia :
— Sim.
E ajuntava:
-— Pobre pequeno Poum!
o x e
A gentil protectora tinha razão para dizer:
«Pobre pequeno» ! como o tempo passa! O
primo Stép é capitão do exercito colonial,
em Africa. A prima Mad está uma velha;
o Poum, a joven e interessante creança mor-
reu no dia em que, vestindo pela primeira
vez calças compridas, o internaram, não sem
resistencia da sua parte, n’um lyceu.
Paul Marguerite.
A NNUNCIOS
EDITOS DE 40 DIAS .
2.º ANNUNCIO
” Pelo Juizo de Direito da comarca da
Certã e cartorio do 2.º officio, no inven-
tario orphanologico a que se procede por
fallecimento de Domingos Ferreira David,
viuvo, morador que foi n’esta villa, em
que é cabeça de casal Domingos Henri-
ques Ferreira Vidigal, da Varzea Fun-
deira, correm editos de quarenta dias a
contar da segunda e ultima publicação
deste annuncio na folha official, citando
Francisco Ferreira David, filha do inven-
tariado, ausente em parte incerta, para
deduzir, querendo, os seus direitos no
referido inventario, nos termos e para os
efieitos do $ 3.º do art. 696.º do Codigo
do Processo Civil.
Certã, 8 de março de 1899.
O Escrivão,
José Antonio: de Moura.
O Juiz de Direito,
Verifiquei. João Loba de Moura,ra,@@@ 1 @@@
GAZETA DAS PROVINCIAS — CERTÃ, 23 DE MARÇO DE 1899
Editos de 60 dias
(2.º annuncio)
Pelo Juizo de Direito da comarca da
Certã e cartorio do escrivão do primeiro
officio Gonçalves e nos autos de justifi-
cação avulsa, para habilitação, em que
os justificantes José Alves e mulher
Maria Joaquina, proprietarios e mora-
dores no logar do Vergão Fundeiro,
freguezia de Proença a Nova, d’esta
comarca, pretendem habilitar-se n’este
Juizo contra pessoas incertas e com ci-
tação e assistencia do Ministerio Publico
como unicos e universaes herdeiros de
seu filho João Alves Martins, solteiro,
empregado do commercio, morador que
foi na Aldeia do Nague, circumscripção
administrativa de Santo Antonio do
Zaire, districto do Congo, Provincia de
Angola (Africa Portugueza), onde fal-
leceu, sem testamento, no dia 13 de
outubro de 1897; e como taes pessoas
legitimas para haverem em dominio pleno
todos os bens da herança do mesmo seu
averbar em seu nome seis inscripções de
do valor nominal de cem mil réis cada
uma, com os numeros 88:965, 92:595,
92:596, 94:706, 122:888 e 153:498,
e bem assim uma inscripção da referida
Junta do valor nominal de quinhentos
mil reis com o numero 63:307, as quaes
todas se acham averbadas em nome do
mesmo fallecido João Alves Martins, re-
ceberem os juros das mesmas inscripções
em divida, e’ que se, forem vencendo, e
de tudo disporem como cousa sua, cor-
rem editos de sessenta dias que come-.
carão a correr no dia em que se publicar
o segundo annuncio no Diario do Governo,
citando todas as pessoas incertas que se
julguem com direito de impugnar o pedido
dos justificantes, para na segunda au-
diencia deste Juizo, posterior ao praso
dos editos, verem accusar a citação e
marcar-se-lhes o praso de tres audiencias. |
seguintes para a contestação, e para
deduzirem por artigos sua habilitação.
Declara-se que as audiencias nºeste Juizo
se fazem todas as segundas e quintas
feiras de cada semana não sendo dia
sanctificado ou feriado porque, sendo-o,
então se fazem nos dias immediatos e
sempre por dez horas da manhã no edi-
ficio do . Tribunal Judicial, situado no
Largo do Municipio d’esta Villa da Certa.
Certa, 4 de março de 1899. Eu
Francisco Cesar Gonçalves, escrivão que
o subscrevi.
O Escrivão,
Francisco Cesar Gonçalves.
Verifiquei. João Lobo de Moura.
KALENDARIO DE MARÇO
Quarta-feira 1] 8/15/22] 29
Quinta-feira 2/9 116/23] 30
Sexta-feira > [10/47/28] 3
Sabbado 4 [11/18/25] —
Domingo o [12/19/26] —
Segunda-feira 6 /13/20/27| —
Terça-feira 7 /14/24/28] —
Quarto minguante E a 3.
Lua Nova & a 44.
Quarto crescente D a 19.
Lua Cheia G’a 27,
ATLA s
GROGRAPHIA UNIVERSAL
Descriptivo e ilustrado
Publicação Mensal
Contendo 40 mappas expressamente gra-
“vados e impresssos a córes, 160 paginas de –
texto de duas columnas e perto de 300 gra-
vuras representando vista. das principaes
“cidades e monumentos do mundo, paizagens,
retratos de homens celebres, figuras, dia-
filho e n’essa qualidade poderem fazer | Srammas, etc,
A primeira publicação que n’este genero
I ‘se faz no paiz.
assentamento da Junta do Credito Publico, ||
‘ciculo contendo uma carta geographica: cui-
‘dadosamente gravada e impressa a côres,
uma folha de quatro paginas de texto de 2
‘columnas, e 7 ou 8 gravuras, e uma capa
Todos os mezes será distribuido um fas-
pelo preço de 150 réis pagos no acto da
entrega.
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signatura devem ser dirigidos à EMPREZA
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Historia dos Juizes ordinarios e de paz
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