A Nympha do Zêzere nº7 26-05-1897

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Semanario noticioso e litterario
a : E *
Decror — E. DE SANDE MARINHA des)
ASSIGNATURA
Certã e Coimbra, 80 reis mensaes — Fóra da Certã, 350 por 4 mezes.
Brazil, anno, 44500 reis. — Africa, anno, 1800 reis. — Avulso, 25 reis.
Toda a correspondencia deve ser dirigida à redacção d’A NYMPHA
DO ZEZERE, Certa.
Degenerescencia, inconscien-
cia e indifferentismo
Singular e desoladora decadencia,
a do espirito portuguez !
Magua intensissima, immenso des-
alento, nos inunda a alma, ao contem-
plarmos o estado morbido e apathico
de doença incuravel, sob 0 qual, mo-
ribunda, exhala os ultimos suspiros,
dum povo grande nas grandes epochas
da historia, a sociedade portugueza
da era presente !
Portugal foi na historia um povo de
heroes, cujas virtudes moraes e civi-
cas se assignalaram em tantos feitos
de gloria na expansão universal da
sua soberania, e se affirmaram na vida
interna com a mais honrada adminis-
tração economica, com a mais sublime
e virtuosa organisação da familia, com
a mais desinteressada e energica fis-
calisão dos nogocios publicos.
Mas o Portugal d’hoje é um paiz
de degenerados, inconscientes e indif-
ferentes que, amarrados à taboa egoista
dos proprios interesses, desprezam
com altaneiro e desdenhoso sorriso a
marcha dos interesses sociaes, para só
pensarem na satisfação dos seus ca-
prichos, dos seus desejos, ainda os
mais desmoralisadores, das suas am-
bições, ainda as mais mesquinhas.
E” realmente aterradora a physio-
nomia sob a qual se apresenta na hora
actual a patria portugueza.
Na organisação economica, o des-
equilibrio e a desegualdade na distri-
buição da riqueza são attentatorios da
dignidade e da egualdade humana.
Emquanto os grandes capitalistas e
industriaes, e os mais graduados func –
cionarios da exploração burocratica es-
tão gozando os mais requintados luxos
e immcraes prazeres, que lhes offerece
– a degenerescencia da civilisação mo-
derna, milhares de familias são escra-
visadas a um trabalho tortuoso e su-
perior às forças da natureza racional
do homem ; outras tantas, para satis-
fazerem as mais urgentes necessidades |
da vida material deixam-se arrastar no
caminho da desmoralisação; e outras,
tantas, em que o sentimento da digni-
dade palpita ainda, resistente às mais
seductoras tentações, deixam-se exte-
nuar e morrer de fome e de cansaço,
após os mais duros e cruciantes sacri-
fícios.
E aquella parte da sociedade, que
se diz civilisada, olha sempre impas-
sivel, indiferente e fria, para esses
espectaculos da dôr humana, cansados
pela expoliação das classes dominantes.
Os poderes publicos, em vez de
cumprirem a sua missão de realisar a
justiça social, vão enchendo de favores
e benesses as mais desmedidas ambi-
ções das classes exploradoras, que os
manteem no potentado politico, votan-
do sempre ao mais criminoso desprezo
as reclamações legitimas das classes
exploradoras.
Tal é, por effeito das flagrantes in-
justiças de organisação economica, a
orientação da politica e da administra-
ção publica: a mais degradante dedi-
cação pelos que teem algum poderio
politico, e o mais infame desprezo dos
fracos e dos pobres.
E o direito, em vez de ser uma
funcção social de equilibrio entre as
forças individuaes e sociaes, uma Sa-
rantia de protecção dos fracos contra
os fortes, ê pelo contrario, o baluarte
das injustiças sociaes em beneficio das
classes dominantes.
À corrupção invadiu todo o orga-
nismo social, em todas as espheras da
actividade humana reina um desen-
freado, e já inconsciente, egoismo, filho
da degenerescencia da raça; e a so-
ciedade sempre impassivel e indifia-
rente perante este espectaculo, parece
não vêr nem presentir o despertar
dos sentimentos populares que ao ca-
lor das injustiças sociaes se levantarão
um dia para castigar severamente os
auctores do crime collectivo.
mm (Sr
SERPA PINTO
Um telegramma da Havas, dhoje,
diz que o estado de saude de Serpa
PUBLICAÇÕES
Cada linha ou espaço de linha, 30 réis. —-Repetições, 20 réis a linha.
Annuncios permanentes, preço convencional.
têem o abatimento de 30 por cento. — Os originaes recebidos, não
se restituem, quer sejam ou não publicados.
— Os srs. assignantes
| Pinto permanece estacionario. O dr.
| Mello Vianna, que o trata, não redigiu
nenhum boletim.
Serpa Pinto encontra-se em Paris.
Pelo estrangeiro
TUMULTOS NA ARGELIA
Em Oran, Belizanc, Sidi-BelAbblés
e outras povoações, tem havido n’estes
ultimos dias graves tumultos.
Os estabelecimentos e as sinagogas
dos judeus foram saqueadas pela po-
pulaça. Em Sidi-Bel-Abbés, um judeu
feriu com um tiro de rewolver, dispa-
rado da sua janella, alguns populares;
a multidão invadiu-lhe a casa lançan-
do-lhe o fogo.
Em Oran, as auctoridades percor-
reram as ruas recommendando sere-
hidade ao povo. Receia-se que este
exerça depradações nas propriedades
dos europeus.
Foram enviados reforços militares
a diversos pontos.
=:
Oran, 24, —Foram expulsos do ter-
ritorio Argelino 7 estrangeiros em con-
sequencia dos disturbios anti-semitas.
O brigue hespanhol Resolucion, que
navegava de Oran para Faro, incen-
diou-se no mar. A tripulação foi salva.
QUESTÃO DO ORIENTE
Telegrammas de Athenas dizem
que o sr. Skouloudis, ministro dos ne-
gocios estrangeiros, conversando com
varios chefes de legação, declarou que
a Grecia não consentiria em dar inde-
mnisação, nem em conceder rectifica-
ção alguma de fronteira.
—Está estabelecida a zona neutra
entre os exercitos gregos e turcos.
—No senado francez, o sr. Honoteax,
ministro dos estrangeiros, disse ter
esperança, de que, em vista do accor-
do da Europa, a Turquia desisterá das
suas pretenções com respeito à Grecia.
—4À situação de Creta complica-se.
Os insurrectos cretenses atacam todos
Os dias as guarnições turcas.urcas.@@@ 1 @@@
& NZMPHA DO. ZEZERE
Abbade Kneippe
Diz-se que o ahbade Kneippe, fun-
dador do systema hydrotherapico, con-
tinua em perigo de vida. Alguns jor-
naes já noticiaram a sua morte. Kneippe
conta 76 annos de edade.
Um telegramma de Calcuttá refere
a desapparição d’um diamante histo-
rico, que tinha sido vendido ao nizan
d’Hyderabad pelo isrealita Alexandre
Jacob.
O nizan tencionava presentear com
essa joia a rainha Victoria, que já pos-
sue, como se sabe, o Kobinoor. Mas
verificou-se ultimamente que o diaman-
te havia sido roubado. Fazem-se bas-
tantes diligencias para descobrir o la-
rapio.
O estudante de medicina, Fernan-
do Boullet, foi julgado pelo tribunal de
Meurthe, por ter tentado matar o pae;
o criminoso foi condemnado a dez an-
nos de trahalhos forçados.
SEGÇÃO DE PERFIS
Vêl-a agora, só em Lisbôa.
As aguas do Tejo hão-de certamente
reflectir a sua imagem querida.
E linda como os amores.
Na lenda antiga, não havia uma fa-
da assim! À sua varinha magica desfaz
os corações em flores, e mil maravilhas
se descobrem então nella,
Os cabellos, que ella tem, não são
como os da outra gente… os d’ella
são longos e mysteriosamente negros,
como uma noite!
As estrellas fugiram um dia, dei-
xando o brilho que tinham nos seus
olhos.
A voz, ai! à voz com que canta, é
assim como uma muzica divina; lembra
“um verso de João de Deus ungido pelo.
olhar de Rachel.
Estatura regular, de formaas gre-
gas, como um anjo da terra… eu
olho-a em, occulta adoração e vejo-a
sempre por toda a parte. ..na reali-
dade e po sonho!
G.
LITTERATURA
A alma e o mar
Aos meus queridos amigos Antonio
Capello Manzarra Franco e Frede-
rico Capelo Manzarra Franco.
Olhem o mar immenso
Como anda a ullular !
— E’ assim a nossa alma,
E” assim como o mar!
As espumas à ver-se
“São sonhos que elle tem,
Gomo os sonhos da alma
Lá se somem tambem!
Ondas são corações,
Paixão a tempestade,
Chama pelos amores
O mar com magestade!
Ai! tambem a nossa alma
Grita pelos amores…
Forma tantos castellos,
Tantos jardins de flores!
Mas bem como succede
Ao mar em agonia,
Assim a nossa alma
Não descança um só dia!
E os castellos desfeitos,
E os amores fenecidos
Apenas se descobrem .
Como sonhos perdidos !
Maio, 1897.
Jos Lixo.
HORAS DE TRISTEZA
Deu meia noite. Sôam badaladas
tremendo pelo ar, lugubres como ge-
midos de moribundo, pesadas e tris-
tes como 0 canto noctivago do mocho
esvoaçando na escuridão das sombras.
E oiço esses sons malditos, ouve-os
a minha alma-como punhaladas resoan-
do no coração a chamarem-me á rea-
lidade, eu -que dormia sonhando a pa-
cificação absoluta das coisas, coração
sem vida, e alma sem soffrimento…
Sinto que me escalda a roupa da
cama, sinto a mordedura das viboras
do desespero e venho, coração em luto,
debruçar-me à janella vêr se ha um
raio de luz no ceu, ou algum murmu-
rio de brisa na terra, que me falle ao
coração.
Mas no ceu ha trevas como na mi-
nha alma em chôro e as brisas da noite
suspiram maldições a casarem-se com
os hymnos de Revolta que a minha alma
pe
– Perpassa- me então o riso da des-
crença nos labios gelados e a garga-
lhada de mo resõa na es-
curidão da noite.
*
Outras vezes, gemidos a soluçarem
a voz, tristezas a enlutar o olhar, a al-
ma vôa para os cemiterios onde tudo
é triste, paraizo de desgraçados que
ha de ser o meu paraizo tambem.
— Young, ó meu amigo, eu amo
o teu cantar soluçado em lagrimas…
tambem chóro… as lagrimas do sof-
frer gelam-se-me no rosto, e a voz es-
“trangula-se-me na garganta…
Se, às vezes, me perpassa um riso
pallido nos labios, é flôr passageira sem
raizes no peito, a murchar, triste, na
ardencia febril que me afogueia o olhar.
Hymnos côr de rosa, risos cheios
de alegria… isso perpassa ao longe
n’ama onda de recordações saudosas,
(2) FOLHETIM
O ULTIMO ABENCERRAGEM
CHATEAUBRIAND
Vinte e quatro annos se tinham pas-
sado depois da tomada de Granada.
Neste curto espaço de tempo haviam
perecido quatorze Abencerragens pela
influencia do clima, pelos accidentes
duma vida errante, e sobre tudo pela
saudade, que vae, minando, pouco a
pouco, as forças do homem. De toda
esta illustre familia sô uma esperança
restava. Abem-Hamet usava do nome
d’esse Abencerragen, que foi accusado
pelos Ziques de ter reduzido a sultana
Alfama. N’elle se reunia a belleza, o
alor, a cortezia, a generosidade de
seus antepassados, com esse doce bri-
lho e leve expressão de tristeza que
dá a desgraça nobremente supportada.
Tinha vinte e dois annos, quando per-
deu seu pae e então resolveu fazer
uma viagem 20 paiz de seus avós,
afim de satisfazer à necessidade do
seu coração, e cumprir um designio
mãe. ;
“* Embarca-se em Tunis; um vento
favoravel o conduz a Carthagena, onde
desembarca; toma a direcção de Gra-
nada, annunciando se como um medico
arabe que ia heborisar entre os roche-
dos da Serra Nevada. Uma mula mansa
e levava vagarosamente para o paiz
onde os Abencerragens viajavam ou-
tr’ora em fogosos corceis; adeante de
elle marchava um guia, conduzindo
duas outras mulas ornadas de campai-
nhas e fitas de diversas cores. Aben-
Hamet. atravessou as grandes charne-
que cuidadosamente occultou a sua|
cas e bosques de palmeiras do reino
de Murça; pela vetustez d’essas pal-
meiras, julgou que teriam sido plan-
tadas por seus paes, produziu n’elle
esta ideia profunda dôr e saudade.
Acolá erguia-se uma torre onde, no
tempo da guerra dos Mouros e Chris-
tãos, vigiava a sentinela; aqui via-se
umas ruinas, cuja architectura demons-
trava origem mourisca; outro motivo
de dôr para o Abencerragem! Apeiava-
se da mula, e sob pretexto de procu-
rar plantas, occultava-se por algum |
tempo no meio d’essas ruinas.
D’ahi a pouco continuava o cami-
nho, adormecendo ao ruido das cam-
painhas das mulas, e do canto mono-
tono do seu guia. Este não interrom–
pia o seu longo romance, senão para
animar as suas mulas, dando-lhe o
noue de bellas e valerosas, ou para as
reprehender chamando-as “madraças e
temosas.@@@ 1 @@@
A NSMPIIA DO ZEZBRE
8
O mais na minha vida, é noite sem
luar, sombra negra da luz que vae per-
der-se ao longe, n’uma confusão de tin-
tas… ao longe, ao longe… onde 0
Passado ri.
WERTHER.
Holophernes, general do rei da
Assyria tinha posto cerco deante de
Bethulia.
Todas as outras cidades, cheias de
terror, se tinham rendido sem resis-
tencia, e a cidade sitiada reduzida a
ultima extremidade, tinha promettido
capitular dentro de cinco dias. .
Judith, não podendo soffrer a en-
trega e captiveiro da sua patria, se
deliberou ao mais raro pensamento
que poderá caber em um homem atre-
vido e denodado ; quanto mais em uma
mulher, é santa.
Despe o cilicio de que estava co-
berta, enxuga os olhos das lagrimas
com que orava ao ceo, manda vir chei-
ros, joias, galas, espelho; veste, com-
põe, enriquece, esmalia; os cabellos,
a garganta, O peito, as mãos, os bra-
cos e até os pês, não de todo cober-
tos, e feita Judith um thesouro de cu-
biça, um pasmo de formosura, sae con-
fiada pelas portas da cidade; salta o
fosso, passa as sentinellas, entra pelo
exercito inimigo e vae direita á mesma
tenda da Holophernes.
Este, prendido de tamanho encan-
to, ordena que em tudo lhe façam a
vontade.
Ella, apanhando-o a dormir profun-
damente, corta-lhe a cabeça, mette-a
num satco, e a traz de presente a
seus conterraneos.
La BRUYÉRE.
At
Lindos olhos negros são
os teus, ditoso amor; –
as lagrimas que d’elles brotam
penetram meu coração,
bem como o ligeiro orvalho
que humedece a flor.
Aurora que me alumias
nos meus dias d’amargura;
és tão formosa e tão pura
como a rosa de jardim.
Se por mim amor sentias,
que alegria que ventura.
Se a Beatriz cantou Dante,
mulher a quem elle amou,
não te julgues desprezada
por seres só por mim cantada,
Petrarcha já te cantou.
Maio, 1897. BaUL DE FREITAS,
TRAÇOS
Nos labios — duas pétalas de rosa,
pedem rócio de beijos,
Nºuma caricia terna setinosa
a insuflar desejos.
Faz-nos pensar nas noites estrelladas
o seu fulgente olhar:
— Suprema luz que veio das madrugadas
e do pranto do luar.
O cabello tão negro como a noite
faz lembrar o desejo
Ao coração que sob elle se acoite,
de o afagar n’um beijo.
E a voz vibrando em tremulas canções,
languida, cariciosa,
Vem mansinho fallar aos corações
n’um sonho côr de rosa.
$
EvARISTO DE CARVALHO.
— DE Na
ANNIVERSARIO
Passou no dia 22 do corrente, o
anniversario natalicio do nosso sym-
pathico amigo Zeferino Lucas.
As nossas felicitações.
CARNET LOCAL
Estiveram entre nós os srs. José
Diniz da Silva Mendes e Antonio da
Silva Carvalho, de Sernache do Bom-
Jardim.
* Já regressou a esta villa o sr.
Adriano Dias Vera, secretario addido
à camara municipal deste concelho.
* Tambem já regressou a esta villa
o sr. Francisco Cezar Gonçalves e sua
ex.” familia.
* Sohiu para Elvas o sr. dr. Abi-
lio Correia Marçal.
* Em inspecção às recebedorias
dos concelhos, está n’esta villa o sr.
Sequeira, aspirante da repartição de
Fazenda Districtal.
* Esteve entre nós o sr. Joaquim
Ferreira Guimarães Lima, do Cabe-
cudo.
* Acha-se n’esta villa 0 nosso ami-
go dr. Accacio Marinha.
CORRESPONDENCIAS |
Coimbra, 25.-—A Faculdade de Me-
dicina elegeu os drs. Daniel de Mattos
e Sousa Refois para representarem a
Universidade no congresso de cirurgia
hispano-portuguez, que deverá reali-
sar-se em Madrid no dia 10 d’outubro.
—Inaugurou-se no domingo passa-
do pela 1 hora da tarde, o novo ma-
tadouro d’esta cidade; assistiram a ca-
mara municipal, direcção da compa-
nhia constructora e exploradora de
aquelle estabelecimento, etc. |
A fachada que é em estylo hispa-
no-gothico, mede 62”,50.
Custou 35:0005000.
—Foi nomeado administrador subs-
tituto d’este concelho, o sr. Alfredo
Augusto da Cunha.
No meio d’estes campos incultos
pastavam alguns rebanhos, no longo
da estrada viam-se passar tambem al-
guns viandantes, porém longe de a
tornarem mais alegre não serviam se-
não para a fazer parecer mais triste e
mais deserta. Esses viandantes traziam
todos uma espada à cinta; estavam em-
buçados em uma comprida capa, e le-
vavam o rosto semi-coberto com as
largas abas de um chapeu. Saudavam
Abent-Hamet ao passarem por diante
delle, o qual seu comprimento só dis-
tinguia o nome de Deus de senhor, e
de cavalleiro. A’ tarde na estalagem,
o Abencerragem tomava O seu logar
no meio dos desconhecidos, sem que
estes o importunassem com a sua cu-
riosidade indiscreta. Nada lhe diziam,
nada lhe perguntavam; o seu turban-
te, O seu vestuario, as suas armas não
excitavam admiração alguma. Já que
Allah tinha querido que os Mouros de
Hespanha perdessem a sua bella pa-
tria, Abent-Hamet não podia deixar de
estimar seus sisudos conquistadores.
– Porém emoções, mais vivas, ainda
esperavam o Abencerragem no termo
da sua viagem. Granada está situada
junto à Serra Nevada, sobre duas al-
tas collinas, cortadas por um valle pro-
fundo. As casas construidas no declive
das encostas, na profundidade dos val-
les, dão a esta cidade o ar e a figura
duma granada entre-aberta, d’onde
lhe proveio o nome. Dois rios, o Xenil
e o Douro, dos quaes, um arrasta na
sua corrente folhas d’ouro, e o outro
folhas de prata, banham as faldas das
collinas, unem-as; e serpenteiam de-
pois no meio de campo encantador,
chamado a Vega. Essa planicie que do-
mina Granada é coberta de vinhas, ro-
meiras, figueiras, amoreiras e laran-
seiras; está cercado por montanhas de
uma fórma e d’uma côr admiraveis.
Um ceu formosissimo. um ar puro é
delicioso introduzem na alma do via-
jante uma languidez secreta e indefi-
nivel. Conhece-se que n’este paiz as
paixões ternas teriam promptamente
suffocado as paixões heroicas, se O
amor, para ser verdadeiro, não care-
cesse de ser acompanhado de gloria.
Quando Aben-Hamet avistou o cume
dos primeiros edificios de Granada, o
coração batia-lhe com tal violencia que
se viu obrigado a fazer parar a mula.
Cruzou os braços sobre o peito, e, com
os olhos fixos na cidade sagrada, ficou
mudo e quedo. O guia parou tambem,
e como todos os sentimentos elevados
são facilmente comprehendidos por um
hespanhol, pareceu sensibilisado e ad-
yinhou que o Mouro sentia ao ver a
patria de seus avós. O Abencerragem
rompeu finalmente o silêncio.
(Contimia).@@@ 1 @@@
4
A NTMPHA DO ZEZERE
— O ponto na Faculdade de, Philo-
sophia é no dia 5 de junho, e em Baço-
logia a 12.
—) curso do 5.º anno theologico-
juridico realisa amanhã nesta cidade
a ultima recita de despedida Jpsis Ver-
bis.
AB:
Oleiros, 25.——Em sessão de 47 do
corrente, foi nomeado medico do par-
tido municipal, o ex.”º sr. dr. José
Maria Rodrigues de Faria, com o or-
denado annual de 3008000 réis e pulso
sujeito à tabella. Porque a indole de
este povo é immenso respeitadora; por-
que o acatamento e estima com que os
cavalheiros mais distinctos, d’esta ter-
ra, costumam acolher as pessoas ex-
tranhas, sem distincção de categorias,
é sobre-maneira attrahente; agouramos
as. ex.? um bom futuro. Que seja bem
vindo.
—Realisou-se a festividade de Nossa
Senhora da Victoria, orago da fregue-
zia do Mosteiro, d’este concelho. Orou
o reved.º padre Luiz, da Gesteira. São
-Superíluos os nossos incomios que a
proficiencia do sublime orador é bem
conhecida. Houve arraial, descantes,
bailes populares, ao abrigo dos altos
e frondosos castanheiros; local tão apra-
sivel, folganças tão innocentes e espon-
taneas, que nos encheram de verda-
deiro encanto, não nos parecendo, en-
tão, demasiado os 300 annos que o
monge, julgando poucas horas, gastou
em ouvir o cantar do passarinho. Ao
terminar aquelle dia, exclamamos como
elle, ao desapparecer-lhe a avesinha:
— 0″ festa da minha alma, para onde
te foste tão depressa.
—Tivemos à honra de camprimen-
tar, nesta villa, os revd.º parochos,
Cesar, do Sobral, Benjamim, do Es-
treito e Barata Dão, da Isna.
— Antonio Dias, ha muito alienado,
suicidou-se com um tiro de espingarda.
— São fielmente cumpridas as or-
dens.e regulamentos contra a vadiagem
dos cães.
Honra ao digno administrador do
concelho, o ex.Pº sr, dr. Barata.
€.
VARIAS NOTICIAS
Encontra-se no Porto, o revd. deão
da Sé de Lisboa dr. Antonio José Boa-
vida, antigo parlamentar e superior
do Seminario das missões ultramarinas.
Na segunda feira passada, morreu
repentinamente em Thomar, um ho-
mem que vinha d’Africa e se dirigia
para Figueiró dos Vinhos.
As auctoridades competentes fize-
ram O arrolamento sendo encontrados
805000 réis e alguma roupa.
Consta que a direcção do Palacio
de Crystal do Porto vae convidar a fa-
milia real a inaugurar a exposição in-
dustrial e a installação do dispensario
da Rainha D. Amelia, que se realisa
em agosto proximo, n’aquella cidade.
N’um dos dias da semana passada,
o sr. Antonio da Silva Girão, da Cava,
freguezia da Madeirã, que ha annos se
encontrava em estado de alienação
mental, suicidou-se com um tiro de
espingarda. Ao ruido da detonação,
accudiram a familia e visinhos do in-
feliz, encontrando-o já sem signaes de
vida.
A sua ex.Ӽ familia, Os nossos pe-
zames.
Um telegramma de Pretoria, diz
que o governo de fourenço Marques
prohibiu a circulação de moeda extran-
geira.
Do Seminario de Missões Ultra-
marinas, de Sernache, sahiram para 0
ultramar os seguintes missionarios:—
Alfredo d’Almeida Xavier, José Alves
Barbosa, José Vicente Fernando do
Valle, Guilherme Nunes Marinha, Ben-
jamin da Silva, Francisco Manuel do
Espirito Santo Guerra, Jssé das Neves,
Julio Cezar Machado, José Lourenço
Tavares, Salvador Coelho da Silva, Vir-
gilio Marôa Cardoso Botelho e Manuel
Damasio Barata d’Azevedo.
Uma viagem feliz, é o que since-
ramente lhes desejamos.
SECÇÃO ALEGRE
Um estroina teve de assentar pra-
ça, e entendeu que podia continuar
com o seu modo de vida intrujando a
humanidade. O coronel era um excel-
lente homem, muito amigo dos seus
soldados, e portanto o nosso heroe tra-
tou de se aproveitar da bondade do
séu commandante. Um dia foi ter com
elle:
— Perdão, meu coronel, se dá li-
CONÇa. vs
— O que é? dize lá.
— Vou-me casar, meu coronel.
— Os meus parabens, rapaz. E a
tua mulher é bonita !…
— Oh! tão linda como a bandeira
do regimento !
— Então sê feliz.
— Obrigado, meu coronel, mas…
— Bem sei, bem sei, toma lá.
E deu-lhe uma libra.
O pandego desfez-se em mil agra-
decimentos, e foi para o regabofe. Pas-
sadas algumas semanas, tendo-se aca-
bado o dinheiro, voltou ao coronel,
muito triste… e choroso…
— O que tens tu, rapaz?
— Uma grande desgraça que me
succedeu. |
— Esplica-te.
— Minha mulher morreu.
— Pobre rapaz!
— E sou tão desgraçado, que nem
tenho dinheiro para o enterro!
— Toma lá, e tem coragem.
E deu-lhe duas libras.
Foi uma pandega resgada nos dias
seguintes. Regressando, meio: ebrio,
para O quartel, de uma d’essas patus-
cadas, mas já sem dinheiro, encontra
o coronel na parada, e não se lembran-
do de que já tinha morto a mulher,
dirige-se a elle:
— Meu coronel, venho participar-
lhe que minha mnlher teve um filho…
— O que?
— Deu hontem à luz, e como so-
mos muito pobres e o meu coronel é
tão bondoso…
Não poude acabar. Uma bofetada
fel-o cahir a vinte passos, abreviando-
lhe o caminho do calabouço.
ANNUNCIOS
BIBLIDTHECA AMOROSA
E” uma nova collecção de contos |
engraçados, estylo realista, suave, tran-
sparente, sem vocabulos pornographi-
cos. Cada volume, que consta de 32 a
64 paginas, impressas em bom papel
assetinado e ornamentado com 5 boni-
tas gravuras, custa apenas 60 réis.
Cada serie de 10 contos ou sejam
320 paginas e 54 gravuras, 500 réis.
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