Gazeta das Províncias nº6 15-12-1898
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sSemanario independente
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ASSICINATURA.
CERTA, mez, 400 rs. FÓRA DA CERTA, trimestre, 330 15, AFRICA, semestre, 1$000 rs. BRAZIL, semestre, 28800 15. Numero avulso, 30 rs.
Toda a correspondencia dirigida à Administração, R. Sertorio, 17, Os originaes recebidos não se devolvem
Ernesto Marinha — Director
FUBLICAÇÕES
“| No corpo do jornal, cada linha 80 13. Anuncios, 40) 78. a linha. Repetição, 20 rs. a linha. Permanentes, preço convencional; os sra. assiquantes
; têm o desconto de 25 0/,. Esta folha é impressa na Imprensa Academica, R. da Sophia. Coimbra
Augusto Rossi — Editor
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HCONPLAGRAÇÃO GERAL
N’um dos numeros anteriores da (ra-
zeta das Provincias, em artigo editorial,
referimo-nos com palavras de sympathia
e esperança à momentosa questão sobre
o desarmamento geral.
Alludimos então ás’ dificuldades que
offerece no presente a sua realisação pra-
tica; não fugimos, comtudo, de confessar
a nossa fé ardente em que esse abençoado
ideal de civilisação será um dia, não tarde,
facto consummado.
Hoje propomo-nos demonstrar que as
difficuldades, que no mesmo artigo foram
objecto da nossa allusão, marcarão âma-
nhã, no seu tremendo choque, o meio mais
facil de conseguir-se o brilhante deside-
ratum da paz universal.
Quaes são, porém, essas difficulda-
des ?
Está naturalmente no espirito de todos
o seu reconhecimento. As ambições des-
mesuradas das grandes potencias e o de-
sejo d’uma desforra excepcional por parte
de algumas d’ellas — oppõem-se eviden-
temente á realisação concreta do sympa-
thico principio humanitario que se encerra
na já conhecida proposta do benemerito
autocrata das duas Russias.
A França tem ainda encascalhada
na garganta a terrivel affronta de Sedan.
A Alsacia e a Lorena reclinam-se acon-
chegadas’sob as azas fortes e pesadas da
“aguia allemã; mas a patria franceza, no
seu coração ardente de nação cosmopo-
lita, tomou-lhes amor e olha-as ainda com
carinho, como sendo um pedaço da sua
generosa alma retalhada | Outras diffi-
culdades circulam, como esta, no ceu
nebuloso da politica internacional, taes
como: a pretendida e já iniciada fragmen-
tação da Turquia, para onde principal-
mente cáem cubiçosos os olhos da Russia,
e a disputada partilha d’esse velho e vas-
tissimo imperio da China que a civilisa-
ção justifica e reclama a todo o custo.
As nações ameaçam digladiar-se na re-
partição dos quinhões. (O Egypto, com a
solução que teve o ultimo conflicto de
Fashoda e com a festejada victoria de
Karthoun, veio pôr de sobreaviso a França
e a propria Russia contra a expansão pro-
gressiva da Inglaterra, affastando esta
para uma approximação cada vez maior
com as potencias extra-europeas, como
Q Japão e os Estados-Unidos.
À visinhança, em Africa, das colonias
inglezas e allemãs está dia a dia creando
novos aitrictos entre os governos das res-
pectivas metropoles, não obstante alguns
accordos apparentes.
— De tudo isto resulta que, attenta
a notavel complexidade e emaranhada
ligação dos interesses internacionaes exis-
tentes, a guerra não tardará em rebentar
com qualquer dos fundamentos referidos;
e, como uma fagulha incendiaria, ella
fará consequentemente lavrar no globo a
mais estupenda conflagração que a his-
toria rememore.
Como, porem, a diplomacia já anda
imbuida d’um largo plano de paz dura-
doura e como as associações de tenden-
cias anti-militaristas ganham campo dia
a dia, de crer é que da conflagração geral
se levante, pura e immaculada, a phenix
da paz, de azas brancas, reflectindo a luz
d’uma bondade eterna!
As nações vencedoras terão de ceder
às correntes d’opinião dominantes nos
seus paizes; e o momento, propício como
nenhum outro, levará a um tractado final
de compensações de territorios e de com-
pensações de territorios e de compro-
missos internacionaes, que deixarão por
em pratica a doutrina sobre o desarma-
mento geral. As nações vencidas, essas,
cuja situação não attingirá a gravidade
que sóe impôr-se em identicas circum-
stancias, não terão, para reagir, nem a
força material do momento, nem paixões
exacerbadas. Os seus interesses, que não
serão accumular sacrifícios mas allivial-
os, muito terão a ganhar, abraçando e
consignando a obrigação mutua de se
desfazerem dos seus canhões e das suas
espingardas.
“Dadas estas premissas, que são logi-
cas à vista das correntes scientificas e
democraticas que por toda a parte se
manifestam, dadas estas premissas, dize-
mos, justo é concluir que a idéa do des-
armamento geral se converterá segura-
mente n’um facto quando estalar essa
extraordinaria hecatombe das nações, que
se annuncia para breve. Depois, poderá
ainda fecundar-se outra magnifica idéa
de progresso, — o federalismo dos ag-
gregados sociaes. ..
A nós, cumprir-nos-ha então accla-
mar, como hoje, essas e outras grandes
conquistas de civilisação, embora venham
envoltas no sangue de mil martyres |
SERVIÇO DE CORREIOS
E” deveras escandaloso como se faz o
correio entre Thomar e a Certã!
O correio é entregue na estação telegra-
pho-postal de Thomar às 4 1/5 da manhã,
ao conductor de malas, afim de que chegue
a Certã às 12 e 10 m. da tarde. Mas não
succede assim, apezar de haver o espaço de
8 horas — o mais que suficiente — para
percorrer a distancia de 49 Kkilometros que
separa as duas localidades.
Poucas são, na verdade, as vezes que a
mala-posta chega a esta villa à hora official;
daqui, como facilmente se deprehende, um
gravissimo prejuizo para o publico. E senão
vejamos :
Chegando o correio muito depois da ho-
ra marcada, isto é, das 12 h. e 40 m. da
tarde e saindo para Thomar às 2 h. e 410 m.
da tarde, impossivel se torna aos habitantes
desta villa mais afastados da estação o res-
ponder no mesmo dia, em caso de urgencia,
attento ao tempo que na estação telegrapho-
postal decorre em pôr a correspondencia em
“ordem a ser distribuida pelo competente em-
pregado.
Quantas e quantas vezes acontece rece-
ber-se uma carta depois da partida do cor-
reio !
Porque não está o correio à hora mar-
cada? Não será porventura já pequeno o
espaço comprehendido entre a chegada e
sahida das malas, isto é, entre as 2h. e
10 m, e as 2 h. de 10 m. da tarde? Por-
que, pois, a demora? Não que o digno
chefe da estação d’esta villa tenha protegido
taes abusos, porque segundo informações
colhidas e dignas de toda a fé, tem sido
incansavel em reclamações.
Urge, portanto, pôr cobro a um tal es-
tado de coisas. Todas as terras da Beira
Baixa e Alta recebem o correio das 7 às 9
da manhã, menos a Certã que o recebe sem-
pre perto das 2 horas da tarde, podendo
sem difficuldade alguma recebel-o às 14 ho-
ras da manhã — o mais tardar ! Um pouco
de zelo da parte do arrematante da condu-
cção de malas e está resolvido o problema.
Porém, não deixaremos passar em claro
um facto altamente significativo do desleixo
a que é votado tudo quanto interessa ao pu-
blico. É o caso que, reclamando-se como
já acima notamos contra as faltas commet-
tidas pela Companhia Viação Thomarense que
arrematou o transporte de malas, esta foi
agraciada em virtude dos seus bons serviços,
pela Secretaria dos serviços telegrapho-pos-
taes de Santarem, com a insignificancia de
30 mintos de tolerancia !
Triste, simplesmente triste !
Ao sr. Director e Inspector geral dos
correios recommendamos este importante
assumpto, conscios do desejo que teem pelo
bom andamento do serviço. E assim, espe-
ramos em breve que a Certã seja digna de
melhor sorte, recebendo o correio mais cedo.
ma Sm
Eleição
Como noticiamos, procedeu-se no do-
| mingo à eleição da meza administrativa da
confraria do Santissimo Sacramento d’esta
freguezia, para o anno futuro.
Ficaram eleitos para: Reitor — José .
Nunes e Silva, Escrivão — Fernando Mar-
tins Farinha, Procurador — Francisco Fari-
nha David Leitão, Thesoureiro — Joaquim
Affonso Junior, e Fiscaes de secção — José
Vaz, Manoel Antonio Manso, Manoel Anto-
nio Martins Valdeira, José Simão, Antonio
Nunes, Manoel Dias e Luiz Farinha.
o (e
MARÇALINAS
Jet
Do nosso bom amigo, o grande, o tal Marçal,
Ha dias recebemos esta carta;
— < Amigo. Haja por lá saude á farta,
Que isto por cá vae indo menos mal,
Não fallando n'um caso singular
Que muito me tem feito apoquentar.
Você conhece, como toda a gente,
Aquella bossa para o jornalismo
Que eu tive sempre desde o feudalismo
E que cansava pasmo ao Gil Vicente,
Ao bom Petrarcha, ao Dante e ao Longino
Bem como ao meu bom mestre — o Rosalino,
Pois agora, amigo, oh! cruel sorte!!!
De todo me faltou a inspiração.
- Ao meu appello a bossa diz que não.
Peor que isto eu só conheço a morte !
E como hei de eu encher o meu jornal
Ainda hoje o melhor de Portugal? |
Portanto descomponha-me a valer
Pois n'isso me fará grande favor,
Notarei erros do compositor
Já que nada de si posso dizer,
Assim o meu papel irei enchendo
E a massa aos assignantes recebendo, »
Neste ponto o papel vinha molhado,
Como se lagrima houvesse alli tombado.
Cansa-nos dó, coitado, eis a razão
Por que ainda delle nos oceupamos.
Far-lhe-hemos à vontade; assim julgamos
Mer'cer o céu como compensação.
Carta de Coimbra
sem
13 de dezembro.
O nosso amigo dr. José Tavares, defendeu
hontem e hoje, na rica e vasta sala dos ca-
pellos desta Universidade as suas theses,
que como se sabe se antepoem à tradiceio-
nal ceremonia do Capello.
José Maria Joaquim Tavares que de ha
muito é conhecido pelo seu brilhantissimo
talento, excepcional dom da palavra, e es-
criptor distincto deu mais uma revelante e
exuberantissima prova da sua capacidade
scientifica.
Argumentaram hontem os ex." Drs.
Teixeira d'Abreu, Callisto, Assis Teixeira e
Paiva e Pitta, e hoje os ex.Ӽ Drs. Fernan-
des, Marnoco, Vilella e Abel Andrade.
Segundo nos afirmam pessoas versadas
e conhecedoras dos segredos da sciencia, as
theses que José Maria Joaquim Tavares se
propôz defender, eram das mais difficeis e
complexas que se têm apresentado nestes
ultimos annos.
Apesar disto, houve-se de tal modo, ql modo, q@@@ 1 @@@
y
GAZETA DAS PROVINCIAS — CERTA, 15 DE DEZEMBRO DE 1898
| isve rasgos de eloquencia tão felizes e bri-
lkantes, que não só da assembleia que en-
chia a vasta sala, como tambem daqueles
| a quem o dever profissional levou a comba-
| telas obteve justos e merecidos applausos,
É que certamente devem ficar gravados no co-
* vação do defendente, e de todos aquelles
“que o estimam e admiram, como tum dos
ornamentos da sciencia. A um dos arguen-
“tes, 0 ex."º gr. Dr. Abel d'Andrade, ouvimos
dizer, depois de terminada a discussão, e em
frente da assembleia, as seguintes phrases :
«Felicito-me por ter feito a minha estreia
como arguente, com um candidato como O
sr, Tavares»: prova evidente e clara, de
“quanto é apreciado o elevado talento de José
Maria Tavares, por aquelles que amanhã o
terão por collega.
Segundo nos consta, José Tavares rece-
be no proximo domingo, dia 18, o grau de
Doutor.
Felicitamos, pois, O nosso querido ami-
go, por mais esta corôa de louros que alcan-
cou, e egual felicitação dirigimos à ex.”
Faculdade de Direito por tão acertada esco-
lha, conscios e convictos que os conheci-
mentos scientificos que José Tavares tão bem
sustentou emquanto estudante se prolonga-
rão no difficil e espinhoso logar que em
breve vae occupar.
Que o nosso amigo nos desculpe se com
estas mal alinhavadas linhas o vamos offen-
der na sua modestia, mas a admiração que
nos causou a brilhante defeza das suas the-
ses leva-nos, como é de dever, a tecermos-
lhe o elogio que tão justamente merece.
G. T.
— o spagegpaç-o— —
ECHOS DA SEMANA
Esses,
— Já tomou posse do logar de tabellião
de notas para que ultimamente foi nomeado,
o nosso amigo sr. Carlos Ferreira David.
— O sr. dr. Antonio José Boavida, su-
perior das missões de Sernache do Bom
Jardim, pediu ao sr. ministro da marinha a
nomeaçãe de auxiliares leigos para acompa-
nharem os 24 missionarios que vão breve-
mente para Moçambique, Angola, S. Thomé,
Timor e Meliapôr.
— Foi nomeado administrador para Tho-
mar, o sr. dr. João de Azevedo; foi trans-
ferido para o Sardoal, o administrador do
Rio Maior, sr. D. José de Mello.
— Está a concurso 0 logar de amanuense
da administração do concelho de Castello
Branco, com o ordenado egual ao do ultimo
serventuario.
— Foi encarregado de parochiar a fre-
guezia de Sant'Anna d'este concelho, o revd.
José Marques de Macedo, de Sernache.
CHRONICAS LIGEIRAS
14 de dezembro.
Após uma semana de deserção que a cri-
tica furibunda do Gran Pedagogo motivou,
retomamos hoje, leitoras, qual pomba da
arca de Noé prescrutando a calma da tem-
pestade, o nosso triste e penoso encargo...
de escrevinhador de chronicas. ..
E assim é que, convalescentes ainda da
refrega do ilustre grammatico, nos apres-
samos sãos e salvos a dar-vos a,boa nova...
E que o caso não foi para menos; nunca Sê
fallou tanto de nós, santo Deus!... Era
para estoirar de orgulho !. ..
Mas, não era de orgulho que iamós re-
bentando, era... da critica !...
— E comtudo, Deus louvado, eramos
nós quem tinha razão !
e
o o
Qutra coisa. Já lá vae um mez que Ler-
minou o praso concedido pela camara mu-
nicipal para os proprietarios caiarem os pre-
dios que nunca conheceram a cal.
Para Lranquillidade de algumas conscien-
cias que p'r'ahi ha, não seria máu aquella
corporação dar um lembrete aos esquecidos
do seu desideratum. ..
º
e e
O tempo corre maravilhoso para os agri-
cultores que, alegres, ultimam as colheitas
da azeitona.
Valha-nos isso, ao menos, no meio de
tantas miserias!...
o
e e
Natal! Natal! — eis o grito unisono
que echoa nos corações da mocidade acade-
mical... ;
— E o Pedagogo n'um áparte: o diabo
das Marcalinas. ..
Ersanma.
ep pe GR mm
- CHRONICA ELEGANTE
————
Regressou a esta villa o sr. padre Domin-
gos Lopes da Cruz, habil coadjuctor desta
freguezia, que foi passar alguns dias em '
Sobreira Formosa.
me
Sahiu para Elvas o sr. Antonio Martins
Farinha, conceituado commerciante n'aquella
praça.
“A
Tem experimentado algumas melhoras O
sr. José d'Azevedo Bartholo, abastado pro-
prietario.
*
Sahiu para Alemquer o sr. padre Joaquim
Dias Bernardo, digno parocho em Santa Qui-
teria de Meca.
e
Regressou ao regimento de infanteria 41,
o seu digno capellão e nosso amigo sr. padre
José Martins Farinha.
*
Sahem hoje para Lisboa as ex.” sr.º
Tasso de Pigueiredo.
*
Passa no dia 24 o anniversario natalício
da ex." sr.* D. Georgina da Silva Bartholo.
*
Está completamente restabelecido o nosso
amigo sr. Antonio Rodrigues d'Almeida Ri-
beiro.
— ae Ce
CANCIONEIRO
YISÃO
A Fernando Medeiros
Se eu deslumbrasse ao refulgir intenso
Dos olhos meigos, que possues, oh anjo !
Deleitar-me-hia de prazer immenso
Acalentado só por ti archanjo.
Eu vi-te um dia meiga e virgem pura
N'um doce enlevo extaziar sorrir
Beber do ceu angelical ventura
N'um somno leve delirar, cair.
Vi-te risonha enamorada e linda
Com teu fulgor a escuridão deter,
Haurir nas rosas de fragrancia infinda
Alamos, deleites de immortal prazer.
E eu n'este ancanto de celeste goso
Sonhei, sonhei, extaziado e louco,
Até que emfim, ai! que sonhar ditoso,
Findou o goso que durou jão pouco,
Mas se hoje visse o refulgir intenso
Dos olhos meigos, que possues, oh ! anjo,
Deleitar-me-hia de prazer immenso
Acalentado so por ti archanjo.
XI-98. :
BALTHAZAR ANDRADE.
NO PELLOURINHO
Em o n.º 5 d'este semanario, defendemo-
nos dos pseudos erros que o illustre peda-
gago sr. Marçal pretendeu notar em o n.º 3
da Gazeta das Provincias.
Provâmos que foi S. S.º quem commet-
teu os erros, procurando emendar, o que
mais uma vez nos veio mostrar que desco-
nhece por completo a grammatica.
D'ahi, furioso, sem defeza possivel, sa-
hiu pela unica, porta que encontrou aberta,
isto é, declarando nos em o n.º 100 do seu
papel que jamais nos responderia !
Fugiu assim ao assumpto para que nos
chamou, julgando talvez que liamos pela
mesma estapafurdia grammatica em que
aprendeu.
Mas já que quer fugir com os pés en-
voltos em lã, para que as suas pisadas não
sejam presentidas, dir-lhe-hemos sempre o
seguinte :
Que conhecemos de sobejo e com dados
irrefutaveis «aonde nascem e se alimentam
essas mis vontades, o que ellas sigmificam na
sua manifestação vil e rancorosa e quanto
vale intellectual e socialmente» o senhor Mar-
cal de quem a ambição apoderando-se, fez
e faz um instrumento de maldade. Se o
nosso intellecto nada vale, ha de concordar
que o seu deixa muito a desejar !...
E diz tambem o illustre caudilho que
tem por nós «o mais desdenhoso desprezo !»
Fazemos nossas as suas palavras; e já que
a sua astucia maligna appellou para a opi-
nião publica, ella que o conhece a fundo, e
a nôs, fará juizo e lavrará o seu imparcial
veridicium.
E, para a outra vez, mais cautella e me-
nos insolencias e pedantismos.
eo CE am mm ——
Baptisado
Baptisou-se no sabbado, na villa d'Al-
varo, um filhinho do ex.Ӽ sr. dr. Antonio
Augusto de Mendonça David.
O neophito recebeu o nome de Antonio.
Serviram-lhe de padrinhos seus ilustres
thios, a ex.”º sr.º D. Maria Carolina de
Mendonça e o sr. conselheiro Alfredo de
Mendonça.
Ao cerimonioso acto assistiram, alem
das pessoas da terra, a ex.”* sr.º D. Maria
Maxima Neves, da Pampilhosa, sua gentil
sobrinha, a ex."* sr." D. Beatriz Neves, e O
nosso amigo Adrião David, d'esta villa.
No fim do baptismo, que assumiu um
caracter deveras pomposo, foi servido em .
casa da ex.”"º sr.? D. Carolina de Mendonça,
senhora de altas virtudes e nobres qualida-
des, um lauto jantar em honra de seu tenro
neto.
cerne E mm e
Consorcio
A filha de Casimiro Perier vae casar. O
pae, segundo a indiscrepção d'um jornal pa-
risiense, oppõe-se ao casamento, mas a me-
nina Perier affronta a resistencia paterna e
o consorcio effectuar-se-ha muito breve-
mente.
6 FOLHETIM
ODIO DE FIDALGOS
Almeida Mendes
Ea
Vous le eroyez heureux? Quelle âme méprisable !
S c'est lá son bonheur, c'est Qtre misérable,
GRESSET — Le Méchant —,
Uma semana depois. . . quando o sol des-
folha os seus ultimos reverberos prestes a
sumir-se nas vagas rumorosas do oceano é
dirige o seu derradeiro adeus à natureza. . .
quatro homens estavam sentados na clareira
de uma floresta fallando em confusão.
Vestiam andrajosamente. grosseiros fatos
de borel; na cabeça tinham uma vaga fórma
de chapéo; juncto d'elles estavam duas es-
pingardas ferrugentas e que talvez exerces-
sem o amavel mister — de corpo presente
— para completar aquelle quadro de córes
repugnantes.
Sobre elles extendia-se a espessa copa de
arvores gigantescas que assistiram ao ani-
quilamento de muitos seculos e que ainda
affrontavam com rigidez os vindouros: em
baixo o terreno areento e alguns cardos
que lhes serviam de divans sob tão lisongeira
alfombra.
Gemia o vento sentidas endechas entre
a ramagem cujo balouço urdia uma toada
- plangente e, até certo ponto, convidativa ao
descanso.
Quçamos o que diz o grupo.
— Manuel, regouga d'ahi como raposa
que és, uma cantiga... O cantar desterra
tristezas.
— E faz com que « quem espera não des-
espere», respondeu o outro passando os de-
dos pelas barbas que causavam asco; mas bem
sabes que eu não sou corista de profissão.
— Leva de rumor, gritou um outro en-
crespando a testa e dando ares de superiori-
dade para com os mais. Façam silencio que
é melhor. A caça póde levantar o vôo para
um outro lado e ficaremos a fazer cruzes na
bocca. E... quem manda, depois fallará-...
— Tens razão, Pedro, replicou o que le-
vantara a voz primeiro; porém, que diabo
faremos para matar o aborrecimento? D'aqui
a pouco vem por ahi o somno e podes ter
a certeza de que só acordarei ámanhã quando
o sol despontar no horisonte « «
— Se te ouvissem, diriam que acabaste
agora mesmo de sahir de uma taberna onde
fizeste completa carregação de mantimentos.
— E com certeza não se enganariam,
respondeu o outro abrindo desmesurada-
mente a nojenta bocca e estirando os braços.
— Quem foi o tolo que cahiu na asneira
de te dar o vinho sem dinheiro à vista?
— Alto lá que eu paguei-o.
— Como ?
— Não ficando a dever nada ao taber-
neiro. Ora esta! como? Tem que vêr...
E deitando-se de bruços soltou uma gar-
galhada achavascada ao mesmo que a sua
hirsuta cabeça se movia compassadamente.
Os companheiros fallavamíem voz baixa
e olhavam de soslaio o que acabara de se
estender sobre a terra: conferenciavam : O
outro adormecera e deixava ouvir uns rugi-
dos disformes sem cadencia alguma.
— Dorme, disse um d'elles; vejamos 0
que tem nas algibeiras.
Levantou-se subtilmente e introduzia a
mão direita no bolso d'onde tirou um papel,
que ia começar a lêr, quando elle erguendo
se d'um pulo cravou um punhal no peito do
ladrão é arremessando-se sobre a carta a fez
em pedaços. Os dous restantes vendo 0 suc-
cedido iam lançar-se ao assassino, mas este
apontou-lhes uma pistola e fel-os estacar.
— Trahidos, trahidos! uivaram elles ran-
gendo os dentes, tendo paralysadas as forças ,
à vista do sangue frio com que os observava
o facinora.
— Mentís vilões, mentis canalhas assa-
lariados por um fidalgo que xafurda no lôdo
em que vos espojaes. Mentis, não vos trahi
porque não pertenço ao vosso bando : que-
rieis roubar os diamantes de um brazileiro
que hoje aqui devia passar? querieis ir lan-
cal-os aos pés de D. Vasco de Mascarenhas,
que domina sobre vós como absoluto senhor
de harem? Atraz, bandidos infames! Fugi,
reptis asquerosos, em quanto vos não esmi-
galho o craneo com a cronha desta pistola.
De repente levou as mãos às barbas e
arremessou-as ao chão.
—Vender-vos-ia?
Os dois tremiam e procuravam um meio
de se vêr livres d'aquelle homem que os fas-
cinava com as suas rispidas palavras, espe-
ravam occasião propicia para poder fagir e
não ficar mortos aos pês do seu antagonista.
— Para diante, bradou elle, quando não
mato-0s.
Tomando alento da propria fraqueza se= 7
NatNat@@@ 1 @@@
GAZETA DAS PROVINCIAS — CERTÃ, 15 DE DEZEMBRO DE 1898
Sciencias & Letras
ME ERMIDA DO «SOL-POSTO,> ORAÇÃO
Mal esmorecida a grande-gala das Ma-
drugadas, todas as almas vão acoitar-se nos
verdes alpendres do Sol-poente e se deliciam
no embalo das melancolias e dos sonhos.
Vai-se descendo o oiteiro da Vida e logo se
nos depara, entre sombrias arvores, a Er-
midinha do Sol-posto; e ninguem ha, seja
lavrador ou poeta, que não ajoelhe na ca:
pella-mór dessa Ermida simples, onde uma
lagrima de sol moribundo arde e chora em
cada vela…
É que a luz, que dessa Ermida nos vem,
é como o cantico espiritual das almas, ao
fim duma devota romaria a caminho da ul-
tima esperança. .. A luz do Sol-posto é, no
ciclorama das cores pallidas, como a endeixa
derradeira dum poema, sob cujos versos
palpita o coração dum grande Poeta ..
Transposta velozmente a Serra do Meio-
Dia, sob a ardencia das paixões, desfechada
a ultima illuzão, eis-me agora, e sempre,
cheio de fé nas coizas simples, fazendo a
minha piedoza romaria, a caminho d’aquella
gazalhadora Ermida. Em cada nicho d’al-
tar ha uma querida Imagem, cujos olhos
para mim se volvem, mizericordiosos, num
afago. . » JVossa Senhora dos Amores, Santo
Antonio dos Namorados, a Virgem das Jilu-
zões, São João dos Bem-Cazados; — e, ao
fundo, num resplendor de luz que empalli-
dece numa espiritual agonia, dorme no nicho
do altar-mór, serenissima, numa quietação
que convida a imital-a, a Senhora da Boa-
Morte, toda cheia de graça, toda alumiada
do ultimo sonho |
É ao encontro della que nós vamos; é
para ella que todas as almas crentes jorna-
deiam, alijando ao mar, como os galeões ao
vir da India num temporal, as mundanas
riquezas que lhe carregam O porão — Vai-
dades, Glorias, Egoismos, toda essa merca-
doria van que lhes peza como um sacco de
remorsos |
E
Uma amortecida luz se esbate nos mu-
ros da Ermida; e, ao tepido banho dessa
luz, o rosto das Imagens veste-se duma côr
melancolica, reflectindo as agonias do Sol-
poente que vai nas almas de quem Já entra.
Nossa Senhora dos Amores! — Quem
ha nà-terra que os não tivesse, corações em
gala, à volta dos vinfannos, se o mesmo
Jezus os teve?… Cavalleiros que foram ao
campo das batalhas, Mareantes que andaram
nas tormentas do mar-salgado, Cruzados e
Santos de quem a alma das terras falla —
por sobre todos os corações alvoreceu a
Madrugada d’oiro, todos elles se embalaram
no seio das suas damas, ao largar de aba-
lada por esse mundo sem fim.
Santo Antonio dos Namorados! — Des-
cantes e dansas na nossa aldeia, sob o ma-
cio Luar… Noite de sonhos ao derredor
dos cazais, no adro, nas misteriozas fontes,
ao som de violas e flautis, chorando maguas
sem allivio! Andam bandos d’Estrellas ao-
“vedór da Lua… E cantigas doces, vindas
dos montes, vindas das aguas, vindas das
grutas, como uma enxurrada de lagrimas
no janeiro dos dezalentos, passam pela nossa
alma, como um crivo-ralo, amaciando-a com
beijos !
Virgem das Ilusões ! — Foi ella sempre
quem, a meio da Noite negra do dezespero,
nos apontou com o olhar a nebuloza da Via-
Lactea, corredia como uma estrada de neve.
E, adormecidos no berço do seu olhar, todos
os corações foram e tornaram à Cruzadas
Santa, cheios d’enthuziasmo, com as vidas
na ponta da lança!… Ao fim da Via-Lactea
(dizia a lenda dos amores) ergue-se a Torre-
da-llluzão, d’altas ameias a esgarçar o Infi-
nito, e donde uns olhos raros nos acenam
consoladoramente. . .
San João dos Bem-Casados ! — Ancora-
doiro hospitaleiro dos galedes que vão em
derrota do legendario paiz do Sol-posto ;
Cabo-da -Boa-Esperança num adro d’aldeia.
— O Vascos da Gama do amor, des-
fraldai as velas das vossas Naus San-Gabriel,
e, vinde, veleiros, pelo mar alto, à conquista
desta Nova-India, farta de riquezas !
me
Ao fim, sob um Arco-lris de clemencia,
na pallidez das tardes cor de sangue € la-
grimas à mistura, a Senhora da Boa Morte
verte sobre o nosso peito alanceado um sor-
rizo ultimo, calmo, remançozo, como no meio
duma floresta negra um filete de Luar !
— Acolhe-me à tua guarda é agazalha-
me sob o teu manto azul, que eu venho do
Paiz-do-Sol, 6 Cabana de Pastores! Venho
desse Paiz doido das Mocidades, onde a Vida
vôa como uma galera fremente no Mar-largo
das conquistas! E a sua bandeira branca,
desfraldada aos ventos galernos, eu a vejo
ainda agitar-se, ás ondas, e como a acenar
por mim, a acenar por mim…
Mas, já nas faldas da ladeira, quem
pode de novo ascender aos corregos da mon-
tanha!?.., quem, uma vez ancorado no
seu porto d’abrigo, pode regressar à Ilha-
dos-Amores onde lhe ficaram pedaços da
alma, muito embora ?…
Extenuado, moribundo, vou repoizar na
Ermidinha do Sol-posto, a sonhar o ultimo
tranquillo sonho, entre as queridas Imagens
das minhas recordações.
— Velhas alvoradas do Sol da minha
Terra! poupai-vos agora, para, sobre O tu-
mulo do meu coração, tecerdes um lençol
doiro que o cubra e dê ao pobre morto a
illusão de estar vivendo ainda as madruga-
das lindas da Infancia que se foil… E vós,
Sol-posto dos meus dias, tingi-vos sempre
Poiro, à farta, à farta, para que, entre o
vosso oiro e o oiro das Alvoradas, mal se
possa atar 0 nó dum abraço, mal se chegue
a demarcar o som dum beijo!
AGUEDA. (Além-da-Ponte) — Do Sol-Posto.
Adolpho Portella.
Carta de Portalegre
14 de dzembro.
Nos ultimos dias o tempo tem estado
primaveril. D’um sol benigno e um azul pu-
rissimo liberalisam à natureza a vivacidade
das suas pompas. – A serra da Penha, para
sul, desenha-se no ceu diaphano numa sua-
vidade de linhas e nuns tons de tal modo
amarellecido e triste, que enlevam a alma é
nos convidam à um doce seismar! Um pou-
co ao norte, estendem-se as ultimas ramifi-
cações da serra de S, Mamede, a mais pro-
xima das quaes guarda nas suas dobras O
encantador retiro de Santo Antonio, num
febril murmurio de aguas… Para os lados
de Sant’Anna, o horisonte rasga-se larga-
mente, por uma planície enorme, recortada
de caminhos e manchada de olivedos, por
onde os olhos se esquecem embebidos em
sonho !…
Com paisagens assim, que só encontram
rivaes em Coimbra ou em Cintra, e com um
tempo creador como o que vae, póde ima-
ginar-se do. bem estar que actualmente aqui
se disfructa. . .
— Vae formar-se nesta cidade uma as-
sociação de bombeiros voluntarios, para O
que se estão constituindo já elementos va-
liosos. É um importantissimo melhoramento
de que já, ha muito, carecia esta Coimbra
do Alemtejo.
Os lamentaveis incendios que, nos dois
ultimos ânnos, aqui se têm manifestado, com
notaveis prejuizos, justificam de sobra a
opportunidade d’este melhoramento.
— O grupo dramatico Visconde do Re-
guengo dá no proximo dia 15, no theatro
desta cidade, uma recita, revertendo o seu
producto liquido em beneficio do Real Monte-
pio Operario Artístico Portalegrense.
Abençoada idéa !
— A Tuna Academica projecta, para de-
pois das ferias do Natal, realisar uma di-
gressão a Elvas, Extremoz e Evora.
Até breve.
José Lino.
— mio CE, Aria
Doente. — Doutor, a minha memoria vae
enfraquecendo dia para dia.
Medico. — Deveras! Nºestes casos, meu
caro senhor, é costume receber o pagamen-
to adeantado.
VARIAS NOTICIAS
Em 4 de janeiro proximo é posta em
vigor a nova tabella dos postes das corres- .
pondencias expedidas por qualquer via do
continente e ilhas para as provincias ultra-
marinas ou vice-versa; será de 400 reis O
porte das encomendas postaes, entre O
continente, ilhas e qualquer dos portos por-
tuguezes da Africa Occidental, onde se acha
estabelecido o serviço de permutação de en-
commendas postaes.
— Está a concurso 0 provimento da egreja
parochial da freguezia de Aguas Bellas, con-
celho de Ferreira do Zezere.
O concurso termina no dia 10 do proximo
mez de janeiro.
———aecip (im
Espol io
Os bens que ficaram por fallecimento
do revd.º Joaquim Pedro Nunes Pereira, de
Abigoaria, estão calculados em 12:0008000
réis, não entrando o dinheiro em metal que
o finado possuia:
Affirma-se que o peculio reservado era
importante, mas ignora-se qual o destino
que tiveram as economias do illustre eccle-
siastico é sabio latinista. 4
Naturalmente estão n’alguma jazida,
onde o acaso só as poderá encontrar. E
tanta gente a morrer de fome !….
Consta-nos que o digno delegado do pro-
curador regio vae requerer inventario judi-
cial, em consequencia de um dos herdeiros
da herança ter fallecido no ultramar, e cujo
obito ainda se não provou legalmente.
«oc rm mem
Um antropofago .
Relatam de Bruxellas que em Schaerbeek
occorreu um facto de espantosa selvageria.
– Dois operarios travaram questão e das
injurias passaram rapidamente á pancada.
Travou-se lucta violenta e de repente, um
d’elles, vendo-se mais fraco, mordeu o adyer-
sario com tal raiva que lhe arrancou uma |
orelha. E mastigou-a e enguliu-a !
Uns transeuntes intervieram, entregando
o antropofago à policia e levando o ferido
para o hospital.
o mio pg
Queimada viva
Em Turim, a esposa d’um empregado
da administração do caminho de ferro, Ama-
lia Calano, foi atacada d’uma febre tiphoide
e, quando o marido estava na sua reparti-
ção, mandou sair as duas creadas, a pre-
texto de compras urgentes. Depois foi bus-
car petroleo e derramou-o na cama; tornou
a deitar-se, largou 0 fogo às roupas do leito
e, sem soltar um grito, esperou a morte.
Os-visinhos, vendo sair fumo, bateram des-
esperadamente à porta. A pobre senhora teve
coragem para ir, horrivelmente queimada,
abrir a porta, expirando 5 horas depois.
E
guiram com passo firme a estrada que con-
duzia à povoação: o rosto do desconhecido
passava por subitas transformações e de seus
labios arqueados saiam palavras, que se não
podiam ouvir.
ENE
— «Embriagado, que ha de elle fa-
zer? Deita-se para ahi: para cama, um
feixe de palha, para cabeceira, qualquer
pedra serve. Amanhã acordará e pen-
sará no que lhe convier.»
Expliquemos os factos do capitulo pre-
cedente: na manhã anterior estava Pedro da
Silva sentado nas ruinas do castello pensando
e estendendo os olhos pela vasta planície que
se desenroláava a perder de vista e de ins-
tantes murmurava algumas palavras que,
soltando-se de seus labios iriam achar echo
no peito de Laura que, contristada por acer-
bas dôres, gemia occulta na sua habitação.
— Já viste a rosa de maio prateada pelo
rocio da madrugada? Já viste o candido
lirio que embriaga qs sentidos com O seu
fragrante perfume? Tal ella era, a rosa, O
lirio, a meiga donzella que um dia vi e jurei
amar.
«A sua formosura tocava a perfeição. ..
Talvez que um raio de luz divina illuminasse
o rosto que tantas vezes contemplei, acalen-
tasse O coração que era só meu e que eu
guardava como o avarento guarda o seu the-
souro. Laura era formosa, Laura era um
archanjo, que seria a perola mais bonita da
corôa do Senhor!»
Pronunciadas estas palavras a voz de
Pedro sumiu-se e um suspiro abafado, qual
quebrar da corda de pranteado alaúde de
infeliz trovador, lhe saiu do peito.
— Chorar, sempre chorar, exclamou com
desespero. Mas «que fôra a vida se n’ella
não houveram lagrimas?» O chorar é bal-
samo infindo para um coração triturado pe-
los pezares. Quem sabe o que aqui vai
dentro, e designou o peito, que chamma
devoradora se anima n’este envolucro ralado
por milhares de anguslias? Solirer é o des-
tino do homem…
Houve um momento de silencio.
— Com os cabellos soltos às brisas ma-
tutinas que embalsamavam os ares com
suaves perfumes, como a inconstante violeta |
dondeja nos jardins osculando as flôres,
assim ella, quando a vi.
«Pedi-lbe uma rosa como symbolo de
amor e negou-m’a dizendo que — «receiava
que me magoasse nos seus espinhos» —;
insisti e ella com as pontas dos breves de- |
dos roubou-a ao arbusto e depois de a des-
pojar de todas as suas armas offereceu-m’a.
Quem a visse amal a ia, tornar-se-ia seu es-
cravo como eu: uma tarde como esta, mas
quando o sol já affrouxa o brilho dos seus
raios, sentados em uma corda de rochedos
que ficavam sobranceiros ao mar, vendo 0
espadanar das aguas em estrugido medonho
e cujo abysmo parecia convidar-nos a repou-
sar em seu seio, declarei-lhe o meu amor é
alcancei a certeza de ser correspondido.
«Que felicidade a minha !
«Quantas illusões povoariam d’ahi em
diante esta imaginação que não sonhava qual-
quer desgraça que lhe viesse perturbar a
paz do seu gôzo! Mas a minha dita criou-
me inimigos e um d’elles. .. miseravel!…
ousou bradar no meio de quem o quiz ouvir,
secundado por devassos dignos de si, que
eu havia seduzido Laura, que se conservava
ainda tão pura como no dia em que a co-
nheci. ER
Deixou pender a cabeça e duas lagrimas
crystallinas aljofarando-lhe as palpebras asse-
tinadas vieram rolar-lhe pelas faces descó-
radas, :
— Fui forçado a abandonala, a deixar
esta aldêa que para nós fôra um idyllio de
amores… Passados alguns’ annos voltei,
mas a desgraça havia tocado com as suas
negras azas, havia crestado as petalas da
flor mimósa. A virgindade morrera, porém,
ainda restava à pureza de sentimentos.
N’este momento Vasco de Mascarenhas
subia a esplanada acompanhado de um ho-
mem de feroz catadura e encaminhava-se para
o local onde Pedro estava sentado: este vendo-
os recolheu-se ao interior de uma torre e
esperou attento o que se seguiria. Os dous
sentaram-se n’uma ameia derrocada e tra-
varam conversa animadissima.
— Fallarás a mais tres homens, dizia o
fidalgo, prometter-lhe-has boa recompensa,
que a prêza dá para tudo: e quanto a ti de-
pois falaremos, pódes ter a certeza de que
– não ficarás mal.
-— Sim, meu fidalgo, lá por isso não seja
a duvida ; mas acho muito arriscada a acção.
Pelo diabo ! é dificillimo,
| Contintia,
>
>@@@ 1 @@@
GAZETA DAS PROVINCIAS — CERTÃ, 15 DE DEZEMBRO DE 1898
Monte-pio Certaginense
Por falta de maioria de socios, não se
procedeu no domingo a eleição dos corpos
gorentes desta sympathica associação, para
servirem no proximo anno. São, por isso,
convidados todos os socios a comparecer no
domingo proximo na sala do hospital, afim
de ter logar a referida eleição e de se tra-
ctar de assumptos inherentes à socidade.
sd
Curiosidade
Morreu ha pouco no Brazil uma franceza,
Augusta Verron, que foi uma mulher formo-
sissima, elegante e muito instruída, sendo
toda a sua vida irreprehensivelmente honesta.
Casou a primeira vez aos 15 annos, a se-
gunda aos 20, a terceira aos 22, a quarta
aos 25, a quinta aos 28, a sexta aos 30, a
setima aos 35, a oitava aos 38, a nona aos
39, a decima aos 44, a decima primeira aos
h8, a decima segunda aos 51, a detima
terceira aos 53, a decima quarta aos 67 e a
decima quinta aos 75, morrendo viuva aos
76 annos! a
Teve por marido : quatro francezes, tres
portuguezes, dois inglezes, um allemão, um
austriaco, um italiano, um brazileiro, um
– Chileno e um belga, que foi o ultimo.
O povo chamava-lhe a mulher fatal.
Dos seus quinze maridos, um foi victima
d’um naufragio, de que a mulher escapou ;
tres morreram de febre amarella, um de
febre typhoide, um de pneumonia, um foi
assassinado no alto Amazonas, um de fra-
clura no craneo, um de peritonite, um de-
pois de uma operação, tres de tuberculose
e o ultimo de beri-béri.
Augusta Verron não teve filhos ; era po-
bre quando casou a primeira vez, enriqueceu
à força de casar, deixando uma fortuna cal-
culada em 200 contos. Falleceu d’uma doença
uterina.
UTILIDADES
Biscoitos inglezes
De 500 grammas de assucar, oito ovos,
quatro d’estes sem claras, bate-se muito
bem e depois deita-se-lhe 125 grammas de
manteiga derretida, a casca de uma laranja
azeda pizada, a terça parte de uma noz mos-
cada e 750 grammas de farinha de trigo,
untando-se uma lata com manteiga, deita-
se-lhe dentro esta massa que fique bem
unida e em estando cozida parte-se em boca-
dinhos, como marmelada e tornam em latas
ao forno a tostar pelos cortes.
Modo de conservar o peixe contra a acção do calor
Ha um meio muito simples e ao mesmo
tempo muito efficaz, para conservar 0 peixe,
sem ter receio que o calor lhe faça damno.
Tome-se miolo de pão e alcool de 32º
em quantidade sufliciente para formar uma
pasta um pouco consistente, com que se en-
“che a bocca e os ouvidos do peixe; cobre-se
este com uma camada de ortigas frescas, e
depois com uma camada de palha, e o peixe
assim conservar-se-ha fresco por muito tempo.
—— tn =o——
SERVIÇO DE DILIGENCIAS
Da Certã a Thomar (via Serna-
che do Bom Jardim, Valles, e Ferreira do
Zezere). Sahe da Certã ás 2h. da t. e chega
a Thomar às 9h. da noite; Sahe de Tho-
mar às 5 da m. e chega a Certã às 12 1/
da tarde.
Da Certã a Proença a Nova.
Sahe da Certã à 1 1/a da t. e chega a Proença
às 5 da tarde; Sahe de Proença às 5 da m.
e chega a Certã ás 9 o da manhã. Esta
diligencia communica com a de Proença a
Castello Branco.
Da Certã a Pedrogam Pe-
queno. Sahe da Certã ás 2 da t. e chega
a Pedrogam às 5 1/9 da tarde; Sabe de Pe-
drogam às 7 da m. e chega a Certã ás 10
da manhã.
KALENDARIO DE DEZEMBRO
Domingo — | 4 |/11/18/25
Segunda-feira |—| 5 |12/19/926
Terça-feira == 6/13) 20/27
Quarta-feira — | 7 | 14/21/28
Quinta-feira 1/8 /15/22/29
Sexta-feira 2|9/16/23/30
Sabbado 3 |10/17/24/34
Quarto minguante a 6.
Lua Nova a 13.
Quarto crescente a 20.
Lua Cheia a 27.
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