Voz do Povo nº17 26-03-1911
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1.º Anno
DIRECTOR
Augusto Frodrigues
Administrador
ZEPHERINO LUCAS
Editor
Luiz Domingues da Silva Dias
Certã, 26 de março de 1911
Assignaturas
Anno…… Izoo. Semestre… Goors.
Para o Brazil. ……. Sipooo réis (fracos)
Pago adiantadamente
Não se restituem os originaes
REDACÇÃO E ADMINISTRAÇÃO
Travessa do Serrano, 8
CERTA
Typographia Leiriense —LEIRIA |
Proprigiate da EMPREZA DE PROPAGANDA LIBERAL
Na 3.º e 4.º paginas, cada linha…
Noutro logar, preço convencional
Annuncios
RJ ORES:
Annunciam-se publicações de que se receba
um exemplar
CREDITO AGRICOLA
Não é n’um pequeno artigo
que póde ser feita uma sufficien-
te analyse á lei do Credito Agri-
cola, recentemente decretada pe»:
lo ministro do fomento.
Ella requer um demorado es-
tudo, tanto pela sua considera-
vel. extensão, como pela impor-
tancia da materia sobre que re-
cae.
* Trata-se de libertar das op-
pressões da agiotagem, numero-
sissimos proprietarios e trabalha-
dores ruraes, facto este que tem
merecido e deve continuar a me-
recer a attenção independente e
criteriosa de todos aquelles que
lidam pela restauração das nos-
sas forças economicas.
Este decreto, afigura-se-nos |
possuir, pela rapida leitura qué .
delle fizemos, excellentes condi-
ções d’exito.
No emtanto as providencias
legislativas que teem de incidir
sobre uma enorme variedade de
situações de trabalho, carecem
de que a pratica as consagre, ou,
melhor, de que a pratica lhes des-
cubra as vantagens e os defeitos,
indicando o modo pelo qual sur-
tam efficaz resultado.
O ministro assim o entendeu,
estabelecendo na lei, orgãos— a
seu vêr — indispensaveis ao func-
cionamento e distribuição do Cre-
dito Agricola, ordenando que es-
ta lei se applique, por emguanto,
á parte continental do paiz, e
declarando que pela futura As-
sembleia Constituinte ella deve-
rá ser discutida e sanccionada.
Tudo isto a nosso vêr é justo
O Credito Agricola terá de ser-
vir a todos aquelles que, luctan-
do com falta de capitaes, culti-
vem o sólo, havendo, porém, de
notar-se que se estes lavram a
terra propria, aquelles agricultam
a alheia; que se uns dispõem de
certa actividade ou intelligencia,
outros não logram taes qualida-
des; que se aqui ha bons terre-
nos. férteis, bem regados, pros-
peros e productivos, além abun-
dam as courelas mirradas, de ter-
ra ingrata e trabalhosa; que se
numa parte ha braços esperan-
do o trabalho, noutra o trabalho
está esperando os braços; em
summa, que, do norte ao sul, se .
desenrola uma indefinida diver- |
sidade de modalidades agricolas,
denotando bem quanto ha por
fazer neste valioso ramo da eco-
nomia nacional.
Era a protecção pela offerta
de recursos pecuniarios destina-
dos a auxiliar o trabalho hones-
to, a necessidade agraria que
mais intensamente se impunha.
Varias tentativas tinham sido
feitas n’este sentido, devendo es-
pecialisar-se as propostas de lei
dos srs. Moreira Junior e D. Luiz
de Castro.
O assumpto porém, vem já de
longe. Estudando a fundo a ques-
tão do Credito Agricola, preten-
deu o fallecido Oliveira Martins
resolvê-la por meio da fundação
de um Banco Rural, com o fun-
damento de que, nos paizes simi-
lares ao nosso, onde se sente
uma deploravel ausencia de sen-
so. pratico, onde a lavoura raro
deixa de ser rotineira e a vida lo-
cal obedece á tradição, n’um las-
timoso amortecimento de iniciati-
vas, não é de esperar grande pro-
veito do que o eminente escri-
ptor chamava «um systema de
focos minusculos de Credito Ru-
ral».
A nova lei tem em vista a crea-
ção d’esses focos, que outra cou-
sa não são as Caixas de Credito
Agricola Mutuo. Todavia, ob-
viando aos inconvenientes que
poderiam resultar da sua exis-
tencia isolada, e que constituíam
o temor d’aquelle notavelecono-
mista, esta nova lei abre no Ban-
co de Portugal um fundo de que
devem utilisar essas Caixas; per-
ceitua que estas, tendo organisa-
ção local, não excedam na sua
circumscripção a área d’um con-
celho; e permitte que, proceden-
do auctorisação do governo, el-
las se possam federar, confrater-
nisando e formando entre si as
Caixas Districtaes de Credito
Agricola.
Depois, relacionadas todas, as
Caixas Concelhias e as Distri-
ctaes fórmam uma rêde de insti-
tuições que se solidarisarão, en-
tretecendo-se e soccorrendo-se
para que, levando o beneficio do
credito: a todos os recantos do
paiz, tomem então o aspecto de
uma vasta organisação bancaria,
orientada pela acção directora da
Junta de Credito Agricola.
Esta concentrará o seu activo
financeiro na Caixa Central de
Credito Agricola que, quando or–
ganisada, terá a sua séde em Lis-
boa, e funccionará junto da As-
sociação Central de Agricultura
Portugueza.
Tal é, em synthese, o espirito
da lei.
Oliveira Martins propunha que
do mais se descesse ao menos:
o actual ministro do fomento pre-
fere que do menos se suba ao
mais. Ha differença de proces-
sos, porém uma completa har-
monia e unidade de fins.
O a e: a
“Caixa economica
Dentro em pouco tempo começa-
rão a funccionar n’este concelho os
differentes serviços d’esta utilissima
instituição.
O juro que a Caixa paga aos de-
positantes é bastante remunerador,
e o levantamento dos depositos ope-
ra-se com muita facilidade.
Logo que os servicos se achem
installados faremos aqui uma clara
exposição de todo o seu funcciona-
mento, a fim de que os nossos lei-
tores se habilitem a fazer com faci-
lidade as differentes operações.
– E estamos certos que, passado
pouco tempo, todos reconhecerão o
alto serviço que acaba de ser pres-
tado a este concelho.
FACTOS E BOATOS
Eleições
No passado domingo,”realisaram-
se as eleições para as commissões
parochiaes das freguesias de Ser-
nache do Bom Jardim, Marmellei-
ro; Sant’Anna e Palhacs.
A” primeira presidiu o secretario
da commissão. municipal, o nosso
collega Zepherino Lucas, , dando a
eleição o seguinte resultado:
Efectivos
Floreano. Bernardo de Brito, Fi-
lippe da Silva Leonor, Antonio Pe-
dro da Silva Junior, Olympio do
Amaral e Isidoro de Paulo Antunes.
Supplentes
Daniel Bernardo de Brito, Joa-
quim Antunes Alexandre, José Joa-
quim de Brito, João Carlos d’Al-
meida e Silva e Antonio Ferreira
Nunes.
r
A” segunda eleição presidiu o the-
soureiro da commissão municipal,
sr. Henrique Pires de Moura, sen-
do eleitos os seguintes cidadãos:
Effectivos
Silverio dos Santos, Manuel Mar-
tins Cardoso e José Álves,
Supplentes
José Nunes da Silva, Manuel Fa-
rinha e José Lourenço.
*
A! terceira presidiu, por delega-
ção da commissão municipal, o sr.
Antonio Barata e Silva, secretario
da commissão parochial d’esta fre-
guesia, sendo eleitos os srs:
Effectivos
José Marcal, Manuel Fernandes
da Silva e João Nunes.
Supplentes
Manuel Luiz; Manuel Cardoso e
Manuel Domingos da Silva.
*
Presidiu à quarta o sr. Cyriaco
Santos, membro da commissão mu-
nicipal, sendo eleitos os seguintes
cidadãos:
Effeotivos
Manuel Antunes, Antonio Antu-
nes, José Marçal da’ Silva, João
Marçal dos Santos e Manuel José,
Supplentes
José Martins, Antonio Marçal,
Manuel Marçal Ereira e Chrisostomo
Nunes da Silva Leitão. ,
Antes de se iniciarem os traba-
lhos d’esta eleição, o seu digno pre-
sidente expoz os fins a que visam
estas eleições, estabelecendo o con-
fronto entre a forma como esta se
realisara e outras do antigo regi-
men. —N’esta, votam os eleitores
com inteira liberdade, usando cóns-
cientemente dos seus direitos, em
favor das pessoas que conhecem, e
que mais confiança lhes merecem.
O sr. Antonio Barata e Silva ex-
poz tambem as circumstancias em
que todos os cidadãos se encontra-
vam perante a Republica, aprecian-
do e explicando criteriosamente as
suas leis c os seus actos.
To RA SE
Não se realisou, na passada se-
mana, a sessão da Camara Munici-
pal deste concelho.
LE eso ç———+
Registo Civil
Foi nomeado official do Registo
Civil n’este concelho, o sr, dr, Ber-
nardo Ferreira de Mattos, um dos
distinctos advogados nos auditorios
desta comarca.
—— DOG.
Tasso de Figueiredo
Assumiu a presidencia da bene-
merita Sociedade Cruz Vermelha,
o nosso querido amigo e patriício,
sr. Tasso de Figueiredo.
TRL ENS D—
Reunião em Thomar
Promovida pelas commissões mu-
nicipal e parochial republicanas rea-
lisou-se uma reunião política na sa-
la das sessões da camara, cedida
para tal fim pela commissão admi-
nistrativa, Estando o recinto litte-
ralmente cheio, o sr. Antonio Ma-
thias Araujo, em nome das commis-
sões, disse que o fim da reunião
era a confraternisação de todos os
elementos que devotadamente qui-
zerem trabalhar para o bem com-
mum «para a consolidação da Re-
publica e regeneração da patria,
propondo para presidente o velho
republicano, contra-almirante sr.
Tasso de Figueiredo, que estava
presente e se acha n’esta cidade em
visita a seus filhos e netos. O seu
nome foi recebido e acclamado com
salvas de palmas. O sr. Tasso de
Figueiredo, assumindo a presiden-
cia, agradeceu penhorado a honra
que lhe era conferida pelo povo.
Falaram os srs. dr. José Tamagui-
nie o tenente Julio Ferreira, que
propoz que fosse eleita uma com-
missão composta dos srs, dr. Ta-
magnini, Antonio Araujo, Joaquim
Barbosa, Cesar Gonçalves e Santos
Fonseca, para urgentemente orga- orga-@@@ 1 @@@
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nisarem um centro republicano. Es-
ta proposta foi approvada por ac-
clamação, sendo agregados, por pro-
posta, do sr. Cesar Gonçalves, os
srs. tenentes Julio Ferreira e Salga-
do. O sr. Cesar Gonçalves pro-
poz tambem que fosse enviado ao
governo provisorio um telegramma
felicitando-o pela nobilissima e pa-
triotica attitude contra os actos dos
bispos. O sr. Antonio Araujo tam-
bem propor que o povo republica:
no de Thomar enviasse um tele-
gramma ao governo, declarando
lhe a sua solidariedade para a solu-
ção das gréves, o que foi approva:
do por acclamação. O presidente,
antes de encerrar a sessão, ainda
dissertou largamente, terminando
por levantar vivas á patria, ao povo
portuguez e ao governo provisotio,
que foram calorosamente corres-
pondidos. Todos os oradores foram
ovacionados, encerrando-se a ses-
são no meio de vivas e de palmas.
Folgamos com a homenagem,
aliaz justa, prestada ao illustre pre-
sidente da commissão municipal
d’este concelho.
CHRONICAS TRIPEIRAS
Das modas Es
(Ao dr. Antonio A. M. Pessanha)
Capricho d’um momento, não é
possivel, geralmente, apanhar o mo-
bil, que determina as ephemeras
evoluções da moda.
– Prende-se, umas vezes, com uma
simples questão de gosto. E, como
tal, não se discute, segundo o co-
nhecido rifão popular.
Outras, crêmos apanhar o justo
momento do seu inicio, ou a sua
causa determinante.
Mas lá surgem immediatamente
incertezas e objecções a pôrem em
duvida a importancia do filão histo-
rico encontrado.
Exemplificaremos o asserto, com
a crinoline, que teve a sua epocha
aurea nos tempos de Napoleão III.
Essa horrorosa moda, que dava ás
saias das senhoras uma rotundidade
de dorna, ou de zimborio da Estrel-
la, disse-se ter sido inventada para
encobrir o estado interessante da
imperatriz Eugenia. Sahiram, então,
das fabricas, mais kilometros de fi
tas d’aço para essa exigencia da
moda, do que de rails para os ca-
minhos de terro.
Se se fôrem, porém, procurar
quadros de grandes mestres, lá se
encontrarão, produzidas, por fitas
metallicas, ou por simples juncos
rotundidades cguaes de saias-balões.
Verifica-se isso, por exemplo, no
quadro las meninas, de Velazquez
(1599 1660).
Outras vezes, e muitas, por mais
que se medite, não é possivel des-
cobrir a fonte de inspiração dos de-
cretos da moda, tão absurdos, tão
incongruentes se nos aprezentam.
E” uma coisa essencialmente volu-
vel, essencialmente ephemera, repu-
diando hoje o que hontem era tido
como apanagio de bom gosto, mas
variando com uma fluctuação tal
que, para os seus escravos obedien-
tes, é uma tortura saber com exa-
ctidão quando é que tal fórma, tal
objecto, ou tal côr devem ser usa-
das, ou antes; proscriptas.
E” iargo o seu dominio e abraça
todos os sexos e todas as edades.
Mas enreda, mais intensamente nas
malhas dos seus decretos a mulher
e, sobretudo, a que se diz civilisada.
*
Nós, os homens, apezar de ori-
ginariamente feios, insusceptiveis,
portanto, de melhoria, tambem pa-
gamos largo tributo a essa deusa
caprichosa, que scismou em querer
fazer-nos bonitos.
Em epocas medievaes, já fôram
voz DO POVO
muito maiores, muito mais custosas,
as oblatas, que depositavamos nos
seus altares, Mas, ainda hoje, ob-
servamos religiosamente os seus
decretos, muito embora, para o nos-
so sexo, a moda se não desate a
legislar com a fecundidade e lar-
gueza, com que o faz para a mu:
her. &
Desde que nos conhecemos, quan-
tas mudanças vimos nós no vestua
rio, nas joias e nos costumes?
D’uma extremidade á outra do
nosso corpo, desde a bota, que cal-
çamos, até no chapeu, que nos co:
bre, quantas e quantas metarmo:
phoses se têm produzido, determi-
nadas pelos inexplicaveis caprichos
da moda!
Umas vezes, a bota arrebita-se
como prôa de barco saveiro, outras,
achata-se gallegamente, quadrada-
mente. Por vezes, o pé dança den-
tro d’ella, folgadamente, como avel-
lã murcha dentro da casca; outras,
á laia de supplício inquisitorial, cons-
tringe-o ella penosamente. Mas tudo
se aguenta caladamente, porque…
é moda.
Umas vezes, a calça colla-se ajus-
tadamente á perna, não consentin-
do que o dono se curve sem que,
em certas regiões, se abram janellas,
por onde espreitem prolapsos de
roupa branca. Outras, alarga-se «de
modo que, n’uma só perna da calça,
ha a vastidão duma Arca de Noé,
onde cabe toda a familia da casa,
todos os creados e todos os animaes
domesticos.
O collarinho, ou se decota até
mostrar à região estomacal, ou tre-
pa pelo pescoço acima até alturas
vertiginosas. Ainda hoje se vêem
collarinhos, similhantes a torres de
menagem, trazendo empoleirada, lá
no alto, a cabeça do dono. Dá isso
ideia—salvo sejal—das cabeças dos
condemnados, que os marroquinos
espetam no alto das suas muralhas.
Daria, emfim, materia vasta, se
fossemos a historiar o que a moda
tem, arreliadoramente, querido fa-
zer aos do nosso sexo.
*
Mas onde a tyrannia da moda
attinge proporções cyclopicas é na
sua legislação para o sexo feminino,
ou, o que tanto vale dizer; para sa-
que aos bolsos masculinos.
Sou dosque acolhem gratamente
o proverbio hindú de que uma
mulher nem com uma flór se deve
bater.
Por isso, não querendo, nem por
sombras, magoar, com apreciações
minhas, a metade bella da creação,
a respeito de modas femininas, dou
homem por mim, e competente que
elle é, não obstante o desamor, to
cando, por vezes, as raias da irre-
verencia, com que elle falla da mu-
lher.
Bastará dizer-se que é d’um na-
turalista que fallamos. E sabe-se
quanto esta raça de sabios são sec.
cos é descaroaveis, mesmo com as
coisas mais belias da creação. Ora
este d’agora, se não bate na mulher
com uma flor, parece, ás vezes, que
lhe bate com o pedunculo, que a
sustenta, mas sufficientemente en-
grossado até ás proporções de esta-
dulho. Por isso, occultaremos muito
do que elle disse em relação ao
caso.
Trata-se do grande sabio Johann,
primo directo de Thopzins, o qual,
no ultimo numero da Revista de bio-
logia, que sae á luz em Figueiró das
Aguas, publica, sob o titulo—Dar-
minismo ou Biblia?-—um substan-
cioso artigo sobre a origem da mu:
lher e sua psychologia.
Como contribuição para o ligeiro
estudo, que estamos versando, va-
mos transcrever a parte, que mais
nos convém e que, afinal, é a mais
suave e menos grosseira de todo o
artigo.
*
Johann tem-se dedicado intensa-
mente ao estudo da linguagem nos
outros animaes, aos quaes Laloy
“chama piedosamente nossos irmãos
inferiores.
Percebe já alguma coisa da lin-
guagem das formigas, Desistiu, po-
rém, de estudar, por mais tempo, à
conversação dos porcos, logo que;
á abundançia de calão, com que el-
les grunhiam as suas phrases; per-
cebeu que eram ainda mais porcos,
quando fallavam.
Mas onde elle tem feito colheita
interessantissima tem sido em fren-
te da gaiola dos macacos, cuja con-
versação elle comprehende como se
fosse da familia,
Ahi surprehendeu elle, em certa
occasião, um dialogo entre duas fe-
méeas, Como servindo de collabora-
ção para o nosso estudo, vamos,
transcrever o fragmento, que segue.
*
«Você reparou n’aquella senhora,
que aqui esteve ha pouco, deante
da gaiola, dando-nos maçãs e no-
zes?»
«Aquella que trazia na cabeça
uma especie de caldeirão invertido,
adornado d’um feixe de nabos e de
um ganso?»
«Sim ! Essa mesma! E como vo-
cê reparou bem n’ella!! Orá diga-
me: patece-lhe bonito aquelle mo-
do de vestir? Aquelle immenso cha-
peu? Aquella saia a prender-lhe as
pernas? E, de ois, veem-nos cá di-
zer Darwin, Haecker e outros, que
aquellas senhoras são nossas des-
cendentes eperfeiçoadas!! triste per-
feição aquella !O que ellassão, é mas
– São umas macacas horrorosamente
degeneradas! Ainda o que nos vale,
para o desgosto não ser tamanho, é
que ellas não surgiram directamen-
de nós; sahiram por uma porta tra-
vessa (Honny soit qui mal y pense!)
Foi preciso passar pelo estado in-
termediario do. pythecantropus ere-
ctus para se chegar até ellas, que
tão feias são, e até elles, que mais
feios são ainda!»
«Vocemecê, comadre, tem carra-
das de razão! Mas, se quer que lhe
falle com franqueza, nós que, afi-
nal, ainda nos podemos gabar de
sermos a parte mais importante da
creação, não nos deveriamos preoc-
cupar muito com o que fazem ou
como que dizem essas nossas netas
abastardadas,
Eu só tenho pena de que ellas
sajam tão curtihhas do bestunto
que não sejam capazes de compre-
hender a nossa linguagem. Porque
se a entendessem, eu sempre lhes
havia de perguntar: Para que é que
andaes vós a tapar, com artifícios
irrisorios, as fórmas, que a natureza
vos deu? Nós que, por infelicidade
nossa, segundo alguns malucos que-
rem, somos vossos avós, precisa-
mos, por ventura de vestuario? Of-
fendemos, acaso, a nossa bella so-
ciedade, ou a nossa simiesca moral,
modificando, tão anti-estheticamen-
te, como vós, a belleza dos nossos
contornos? Precisamos de fournures,
cuias, ou dentes postiços ? Não, não
precisamos. E nem por isso deixa-
mos de encontrar companheiro que
nos afague! Nem é preciso andar a
entreter-nos com essa critica de
soalheiro, com que vós vos
mordeis, ao analyzardes de soslaio
o vestuario das que passam !»
«Era bem feito que lh’o disses-
se! E aquellas saias! As taes saias
que ellas trazem agora! Já reparou
ú’ellas? Eu não sei se ellas despre-
zaram, ou não, o nosso elegantissi-
mo habito de saltarmos duma ar
vore para outra, suspendendo-nos
pela cauda; mas, se o conservaram,
eu sempre queria ver como ellas o
haviam de fazer com aquelle travão,
que a moda lhes lançou ás pernas:
«Isso sim! Nem dum vaso de
mangericão para outro poderiam
saltar!»
«E vossemecê sabe dizer-me para
onde ellas mandam as tripas e todo
o mais recheio que, julgo, ainda el-
las devem ter no ventre. E faço lhe
esta pergunta, que já tenho feito a
mim propria ao vêlas arrochadas
com essa. couraça d’aço, que ellas
chamam o espartilho devant droit…
Provavelmente mandam tudo pa-
ra… o outro lado!»
E, n’uma gargalhada aphonica,
desataram a rir da propria chalaça.
*
De muito mais constava o artigo
do erudito, Johann.
Paramos, porem, aqui, na trans-
cripção, porque o resto, como é de
suppôr, vinha n’um tão descaroavel
tom de desamor pelas nossas com-
panheiras da vida que resolvemo
não o aproveitar. ç
Do extracto, comtudo, que fize-
mos, se poderá vêr o theor da apre-
ciação que, fora do genero humano,
se faz das actuaes modas femini-
nas.
Rhuy Pires
— Pelo mundo litterario
Episodio d’amor
Estava-se em Abril.
A chuva, fria e penetrante, cahia
sem cessar. Nuvens escuras, sobre
a montanha, encastellavam-se amea-
cadoras.
Descendo o pedregoso e estreito
atalho, dirigia-se para a estrada, um
cavalleiro embuçado, galopando, co-
mo se fosse fugido á colera dos ele-
mentos.
A escuridão é profunda; sente-se
apenas o galopar do- cavallo que já
deixa a estrada, voltando a novos
atalhos mais perigosos ainda. Os re-
lampagos fuzilam vivos no espaço
é o ribombar do trovão faz por ve-
zes estacar o nobre animal.
O cavalleiro sem perder o sangue
frio, falla-lhe, anima-o, e cheio de
coragem, avança sempre, sempre…
Junto d’uma das varandas do so-
berbo palacio, por muito tempo,
uma dama gentil fixou anciosa a es-
trada escura é lamacenta.
Com o desalento na alma, levan-
tou-se mais uma vez, € debruçando-
se na varanda, procurava escutar a
approximação d’alguem por quem
tantosuspirava oseu pobrecoração..,.
Nada; e a formosa dama, de lon-
gos cabellos d’ouro, o pequenino
seio palpitando arquejante, olha a
estrada, ainda uma vez, fecha de-
moradamente a janella e’ retira-se
soluçando para os seus aposentos.
Defronte da janella pára um ca-
valleiro. O cavallo, exhausto de for-
ças, quasi se não sustenta de pé. O
cavalleiro olha demoradamente a
janela onde ha pouco a luz da sua
alma brilhava anciosa, € nada vê…
Alguns instantes mais cêdo e to-
da a sua fadiga lhe teria parecido
um sonho…
Certa.
A, Valente
— aco
Ainda se encontra no Collegio das
Missões Ultramarinas, em Sernache
do Bomjardim, o sr. D. Antonio
Barroso.
— —— oco ——
Operações eleitoraes
Chamamos a attenção dos nossos
leitores para o annuncio que na sec-
ção competente publicamos ácérca
do início das operações do recen-
seamento eleitoral.
E” conveniente que todos aquelles
a quem a nova lei deu o direito de
voto, apresentem os seus requeri-
mentos á respectiva commissão, a
fim de que o novo recenseamento
represente absolutamente a verdade,de,@@@ 1 @@@
Voz DO POVO
JOIAS LITTERARIAS
MINUETE
Vae dançando o Minuete
A Dugueza, em passos d’ave,
Tic, tac,
No tapete,
A Duqueza em passos d’ave,
Vae dançando o Minuete,
Prende a saia côr de rosa
Com dois dedos, levemente,
Tic, tac,
— Graciosa,
Com dois levemente,
Prende a saia côr de rosa.
Tem gentis chapins vermelhos,
De setim, auri lusentes,
Tic, tac,
– Como espelhos,
De setim auri-lusentes,
Fem gentis chapins vermelhos.
Empoada á marechala,
Ao sorrir tudo illumina
Tic, tac,
– Pela sala,
Ao sorrir tudo ilumina
Empoada á marechala.
Poz subtis mouches na face,
Lembra a aurora que de leve
Tic, tac,
Se estrellasse,
Lembra a aurora que de leve
Poz subtis mouches na face.
Em galante reverencia
O Marquez, de frente, avança
Tic, tac,
Com sciencia
O Marquez, de frente, avança
Em galante reverencia,
Traz a veste avelludada
De escudeiro da Rainha
Tic, tac,
Sob a espada,
De escudeiro da Rainha
Traz a veste avelludada.
E’ gentil como uma flôr,
Em duelos e em amores
Tic, tac,
Vencedor, »
Em duellos e em amores
E* gentil como uma fôr.
E ao trillar do Minuete,
Tem nos madrigaes a esgrima
Tic, tac,
Do florete,
Tem nos madrigaes a esgrima
Ao trillar do Minuete.
Daniella
— << PHGDICE—————
Conselhos aos lavradores
Algumas palavras sobre adu-
bações chimicas
São bastante complicadas e exten-
sas as leis a que se subordina o pro-
blema deveras complexo das aduba-
ções.
Alguns lavradores aplicam levia-
namente os adubos chirnicos procu-
rando na sua aquisição, não que as
condições phísicas e chimicas da ter-
ra possam aproveitar com o adubo
que vão fornecer ao terreno, mas
simplesmente tendo em vista o obter
adubos por um preço baixo.
Esta leviandade dá logar a que se-
ja muitas vezes ludibriado nas com-
pras que faz e d'ahi resultar como
consequencia immediata o condem-
narem absoluto o uso dos adubos.
E” explorado com a leviandade do
lavrador que até já ha fabricantes de
adubos que dentro das saccas inclu-
em uma senha ou cousa semelhante
promettendo premios aos comprado
res, premios conferidos pelas lote-
rias, etc,
A bem ha lavoura e do progres-
so da agricultura nós entendemos
que o governo devia compelirafisca-
lisação dos productos agricolas, no
ramo que respeita aos adubos chi-
micos, a cumprir com rigor o regu-
lamento.
Pondo por agora de parte este as-
sumpto, vamos daraos lavradores al-
guns conselhos que pela nossa prati-
ca e qualidade de diplomado com um
curso de agricultura, intendemos em
nossa consciencia dever dar-lhe.
Para uma boa adubação completa
de um terreno, torna se necessario
o colher uma amostra de terra e en-
viala a um laboratorio. Só assim a
adubação poderá ser boa, de contra-
rio esses adubos vendidos por fabri-
cantes e revendedores menos escru-
pulosos, como bons, podem dar pou-
cos ou nenhuns resultados.
Gom a adubação convem dar ao
terreno um fundo de fertilidade sendo
a melhor epocha para a execução das
grandes adubações e das lavouras.
Os melhores adubos neste caso
são os de lenta solubilisação como
são a cal azotada, o fosfato Tomaz
é O kainite, principalmente nos nos-
sos terrenos. ;
Desde que a terra esteja assim
preparada, pode em qualquer epo-
cha receber a cultura que se quizer
fornecendo quando muito um refor- -
ço de adubo cm que predomine o
elemento em que a planta for mais
exigente.
oncluindo diremos ser boa pra-
tica e de resultados: o emprego de
500 a 1.000kilos de fosfato Tomaz,
a mesma quantidade de Kainite e
15o a 200 kilos de cal azotada por
cada hectare ou seja um quadro ten-
do 100 “metros de largo por 100 me-
tros de comprimento.
Esta adubação é economica e põe
o lavrador ao abrigo de contrarieda-
des, não tendo elle a recear exgota-
mento do terreno. ?
Cardoso Guedes.
—— SOCO
Partido medico
A commissão municipal deste
concelho propoz á camara munici-
pal a creação d'um partido medico
com séde em Pedrogam Pequeno.
Achamos justa e necessaria esta
medida, tanto mais que n'aquella
importante povoação existe estabe-
lecido um hospital da misericordia.
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